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Cinema português é um sucesso na plataforma de "streaming" Filmin

por Roni Nunes, Terça-feira, 30.05.17

Artigo originalmente postado em Sapo Mag (http://mag.sapo.pt/cinema/atualidade-cinema/artigos/cinema-portugues-e-um-sucesso-na-plataforma-de-streaming-filmin)

 

Cinema português é um sucesso na plataforma de "streaming" Filmin

O cinema português é o mais procurado na Filmin, que disponibiliza uma série de obras alternativas mediante subscrição.

 
 

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Eventualmente contrariando certas expectativas, o cinema português é o mais procurado do serviço de plataforma de "streaming" Filmin, que disponibiliza uma série de obras alternativas mediante subscrição.

 

Operacional desde o ano passado, a distribuidora contabiliza a oferta de quase uma centena de títulos da filmografia nacional – uma seleção que surgiu através da criação de um canal dentro do “site” exclusivamente dedicado à produção portuguesa.

 

Em causa também está a curta vida dos filmes após o circuito de festivais. De acordo com Stefano Savio, diretor da Filmin, “o cinema português é muito falado e pouco visto, e no vasto catálogo da produção nacional há inúmeras obras que estão fechadas numa gaveta há anos sem possibilidade de serem exibidas. Com o nosso projeto tentamos evitar o rápido esquecimento que acontece a muitos filmes portugueses depois de uma estreia num festival ou de uma passagem pela televisão”.

 

A pouca valorização comercial da produção nacional, de uma forma geral, faz com que muitas obras não entrem sequer no circuito de DVDs ou "Video-on-Demand". Neste sentido, a plataforma termina por ser um canal para produtores e distribuidores que queiram dar nova vida ao seu filme.

 

Os últimos grandes eventos internacionais tiveram filmes portugueses premiados – caso de Veneza, Sundance, Berlim e, na última semana, Cannes – com o prémio da Fipresci endossado a Pedro Pinho e o seu “A Fábrica de Nada”.

 

“Portugal é um país que encontra um grande conforto na valorização positiva no estrangeiro, mas esta característica ainda não é suficientemente forte para aproximar o grande público da produção nacional. Penso que podemos ajudar a colmatar essa lacuna”, salienta Savio.

 

Entre os quase cem títulos nacionais do sempre difícil de encontrar cinema lusitano estão disponíveis quase todos os autores portugueses mais reconhecidos, como Miguel Gomes, João Botelho, João Canijo, João Salaviza, Ivo Ferreira, Pedro Pinho, João Nicolau, Manuel Mozos e muitos outros. Desde grandes sucessos, como “Os Maias” ou “Tabu”, até pérolas à espera de serem descobertas.

 

O acesso à plataforma Filmin pode ser efetuado através de uma subscrição mensal de 6,95€, sem fidelização obrigatória, ou através do aluguer de filmes à unidade, durante 72 horas, com valores entre 1,95€ e 3,95€.

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por Roni Nunes às 18:29

Cannes, penúltimo dia: uma análise com Paulo Portugal

por Roni Nunes, Sábado, 27.05.17

Já quase a completar duas décadas de participação no famoso festival da Croisette, Paulo Portugal, este ano em Cannes pelo Sol, Jornal I e Insider, fez um balanço de uma edição muito promissora no papel - mas que, como seria inevitável, trouxe confirmações e algumas desilusões. Na altura da entrevista faltavam ser exibidos os filmes de Fatih Akin e, uma das esperanças de praticamente toda a gente depois do fabuloso "Temos de Falar com Kevin", Lynn Ramsey.

 

Loveless.jpg

 

A programação da competição oficial de Cannes este ano era, no papel, irrepreensível. Acha que a espectativa inicial tem se confirmado? Será a melhor edição em anos com base nos filmes que já viste?

 

No papel, tudo é sempre incrível. Mas, infelizmente, os filmes não respondem pelo nome dos realizadores ou o hype que vão ganhando. Por isso, acabamos por gradualmente ir refreando as nossa expectativas. Pelo menos, assim aconteceu este ano. Se é a melhor? Acho que já vai respondido... 

  

Até agora o maior consenso positivo será em torno do filme russo “Loveless” (foto acima). Já ouvi críticas de russos que dizem que o realizador Andrey Zviyagintsev vende para o Ocidente uma perspetiva falsa da verdadeira Rússia… Independente disto, parece que ele conseguiu outra vez agradar toda a gente.

 

Sim, "Loveless", o novo filme do Zviyagintsev é forte e conciso. Mas talvez não tanto como Leviatã.Ainda assim, um cinema irrepreensível e preciso, a traçar um retrato da atual sociedade russa, de um certo desamor baseado num afastamento social, embora com pudor de apontar um dedo que seja ao sistema. Algo que estava mas presente em Leviatã. De resto, o próprio realizador, com quem tivemos oportunidade de falar, mostrou-se mais cauteloso e sublimando qualquer tipo de ingerência política. 

 

Um filme no qual eu, pessoalmente, depositava boas espectativas, era o do Robin Campillo – porque era apenas o seu terceiro filme e o anterior, “Eastern Boys”, era muito intenso. Com uma abordagem de temática LGBT, acha que será o outro grande candidato à Palma de Ouro?

 

"120 Batimentos por Minuto" (assim poderá ser o eventual título em português - apesar de não confirmar a aquisição nacional) é candidato sim. Mesmo sem ter presente a atualidade do tema, não deixa de ter uma mensagem forte, que rima mais com ação e menos com palavras. E com o tal beat. A mim fez-me lembrar a mesma urgência de passar à ação, em "Nocturama", o tal filmaço de Bertrand Bonello, cujo tema por incluir atentado em Paris ficou o ano passado afastado de Cannes. E que insiste em não estrear. Mas, sim, Campillo, sim!

 

Depois há sempre Haneke. Que impressões notou dos presentes e quais as tuas próprias sobre o filme?

 

Haneke precede Haneke. E este "Happy End" já vem falado desde o ano passado por Isabelle Huppert - de resto terá sido dos primeiros - se não mesmo o primeiro, a chegar à seleção oficial. Ainda assim, não figura nos meus "palmarés". Será por deixar tudo em lume brando, como em "O Lanço Branco"? Por aflorar de forma afetiva o seu próprio cinema? Seria uma Palma demasiado óbvia. E, a meu ver, imerecida.

 

E Cannes não pode viver sem controvérsias entre os críticos. Parece que a fazer de Refn ou Sorrentino, este ano, há Yorgos Lanthimos – outro realizador que tem no currículo filmes fortíssimos… Ao mesmo tempo as críticas ao filme de Bong Joon-ho parece mais uma questão de embirrar com a Netflix, certo?

 

Não sei. Lanthimos tem muitos entusiastas. Pessoalmente, parece-me que já é um Lanthimos cercado sobre si próprio, como tive ocasião de escrever. E até a substituir-se a Haneke. Mas isso pode ser só coisa minha. Atenção, gostei muito da "Lagosta". E (Nicole) Kidman não trás absolutamente nada.

 

Quanto ao "Okja", sou sincero, não me parece ser um filme talhado para a Seleção Oficial de Cannes. Disse-me o realizador, na nossa entrevista, que o filme já estava desenhado antes da chegada da Netflix. Tudo bem. Mas mantenho a mesma ideia. Se era para fazer uma fantasia juvenil, mais calhada para o pequeno ecrã (e quem disse que não pode ser um filme vistoso como este?), então passava fora de competição, para mostrar as estrelas. Tilda Swinton é uma grande atriz, mas não acrescenta nada ao filme. Tal como um Jake Gyllenhaal pateta. Se fosse apenas um filmezinho coreano ficava melhor.    

  

Quando escrevi o artigo de abertura e nenhum filme tinha sido exibido, apostei a brincar no filme do Haneke como favorito. A estas alturas, depois de teres visto quase todos filmes da competição, queres fazer a tua aposta?

 

Pois, com o Haneke não se brinca! Se é de aposta que se trata, gosto de ganhar, por isso procuro fazer uma análise colocando-me na cabeça do júri que tem de decidir. Assim sendo e olhando para os filmes que me agradaram, diria que os que têm possibilidade de vencer a Palma de OUro deveriam mostrar alguma intencionalidade em fazer bom cinema e ter um tema pertinente para os dias de hoje.

 

Eu ficaria satisfeito se o prémio maior (ou do júri) fosse entregue ao fulgurante sueco "The Square", de Thomas Ostlund. Há aqui um confronto que agita (e de que maneira!) o nosso confortável modo de vida. Um filme que nos faz perguntas para as quais não sabemos se conseguimos ter uma resposta isenta. Fazer isso com grande cinema é atingir algo grandioso. Ainda por cima com arte. O cinema sensorial da japonesa Naomi Kawase começa a reclamar o devido reconhecimento. "Radiance" pode não ser perfeito, mas falta-lhe muito pouco.

 

Vivemos entretanto (mais) uma brava partida de Ozon. Falta ainda Fatih Akim, que promete trazer tema e emoção para cima da mesa. E ainda a escocesa Lynn Ramsay (uma nossa preferida), que não faz cinema por dá cá aquela palha. Por isso, teremos Palmas até ao fim!

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por Roni Nunes às 12:40

Artigo/entrevista sobre "Perdidos", que estreia hoje (18/05)

por Roni Nunes, Quinta-feira, 18.05.17

Artigo originalmente postado em SAPO MAG (http://mag.sapo.pt/cinema/atualidade-cinema/artigos/ha-que-levar-publico-as-salas-admite-realizador-portugues-de-perdidos?artigo-completo=sim)

 

"Há que levar público às salas", admite realizador português de "Perdidos"

 

Dânia Neto é a estrela desta história passada em alto-mar, onde um grupo de seis amigos fica sem ter como voltar para o barco onde estavam. O SAPO Mag conversou com o realizador Sérgio Graciano e o argumentista Tiago R. Santos sobre a aventura.

 

 

Perdidos" narra a história de seis amigos que vão passar o final de semana num barco. Por casualidade, no entanto, eles atiram-se todos para água sem que ninguém tenha lembrado de pôr a escada para que possam voltar…

 

A partir daí formam-se os contornos de um “thriller” de sobrevivência – com os seis enfrentando a probabilidade de morrer no mar alto. Para piorar, o casal formado por Dânia Neto e Diogo Amaral tem o seu bebé a dormir na embarcação…Completam o elenco Afonso Pimentel, Dalila Carmo, Lourenço Ortigão e Catarina Gouveia.

 

Público para o cinema português

 

“Perdidos” tem produção de Leonel Vieira, realização de Sérgio Graciano e argumento de Tiago R. Santos. Trata-se de um “remake” de “Armadilha em Alto-Mar” (2006), sequela de “Open Water- Em Águas Profundas (2003)”.

 

De acordo com o produtor na apresentação do projeto no cinema São Jorge, em Lisboa, “há anos” que ele esperava que alguém lhe aparecesse com uma ideia para um “thriller” – segundo ele, um género inexplorado em Portugal. Como isso nunca apareceu, decidiu comprá-la à uma produtora alemã.

 

Por trás de tudo está a ideia de fazer cinema de género. “Não é um projeto para ir a Cannes ou Veneza, é apenas entretenimento. Queremos que as pessoas fiquem coladas ao ecrã”, disse.

 

Em conversa com SAPO Mag, Sérgio Graciano e Tiago Santos complementam. Para o realizador, “não há filme de género em Portugal e este pode ser um passo enorme para chegar a esse tipo de cinema. Há que levar público às salas. Não nos enganemos, toda a gente quer fazer público, mesmo que muitas vezes digam o contrário”.

 

Tiago Santos, argumentista, especifica: “Sem querer colocar qualquer tipo de cinema de parte, uma vez que, quando são honestos, todos são legítimos, acho que fazem falta cá projetos onde há uma vontade explícita de levar o espectador numa viagem emocional, seja para fazer sorrir ou chorar, agarrar-se à cadeira ou fechar os olhos de medo”.

 

O mar imprevisível

 

"Perdidos" foi filmado na Madeira e, com uma parte longa da história passada na água, exigiu uma paciência especial da produção.

 

 

“É sempre difícil jogar com a imprevisibilidade do mar”, diz Graciano. “Isso foi uma das maiores dificuldades, corríamos sempre o risco de marcar uma cena e depois a corrente impor outra “mise-en-scène”. A certas alturas, optava por marcar tudo em cima do barco e depois adaptar consoante a ‘vontade’ do mar”.

 

Também dos atores foi exigido um empenho extra. “Foi muito difícil para eles, muitas vezes tudo o que estava combinado tinha que ser refeito”.

 

A história

 

Com um filme passado num período “contínuo” de tempo e sempre no mesmo espaço, a dosagem entre ação e progresso do filme passa, inevitavelmente, pelos conflitos dos próprios personagens.Tiago Santos explica que o desenvolvimento do argumento passou pela desconstrução do original – a cargo de Adam Kreutner e David Mitchell, no sentido de perceber o que funcionava ou não.

 

“Cheguei à conclusão que tudo passaria pela construção das personagens e das ligações entre elas. Quanto melhor o espectador as conhecesse e criasse empatia com os seus dramas e segredos, mais eficaz seria o filme”. Assim, ao longo do avanço da história, abre-se um “terreno fértil, devido ao pânico e ao desespero, para confissões, revelações e redenções. O filme fica quase dividido em dois atos, onde na primeira parte as pessoas se mostram como gostariam de ser vistas e na segunda revelam a sua verdadeira natureza. Para o bem e para o mal”.

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por Roni Nunes às 23:44

Entre a "arte pela arte" e a fogueira das vaidades: começa hoje (17/05) o Festival de Cannes

por Roni Nunes, Quarta-feira, 17.05.17

Artigo originalmente postado em C7nema (http://www.c7nema.net/festival/item/46649-entre-a-arte-pela-arte-e-a-fogueira-das-vaidades-comeca-hoje-17-05-o-festival-de-cannes.html)

 

O festival mais pomposo do mundo começa hoje (17/05) e termina a 28. Enquanto abrem-se as passarelas para a fogueira das vaidades fazer o seu desfile entre tapetes vermelhos e coquetéis à beira-mar, ficam para os suspeitos do costume a tarefa de salvar o conceito romântico de "arte pela arte".

 

É um "dream team" autoral numa programação irrepreensível: este ano a Seleção Oficial é de tal ordem precisa que nem desordeiros como Nicholas Winding Refn ou Paolo Sorrentino estarão por lá para a guerra dos apupos. E arte visceral... haverá?

 

Marion Cottilard volta dos mortos

 

Arnaud Desplechin e o seu Ismael's Ghosts garantem uma abertura caseira – com elenco de luxo: Matthieu Amalric, Charlotte Gainsbourg, Marion Cotillard, Phillippe Garrel. Amalric é um realizador prestes a iniciar um novo filme – quando a sua antiga amada (Cotillard) "retorna dos mortos" e torna a sua vida um inferno. Ele então remete-se à reclusão junto dos seus fantasmas. Por estas horas já exibido à imprensa (a sessão de gala é à noite), parece ter recebido uma ensurdecedora indiferença.

 

 

De resto no alinhamento francófono há um François Ozon com seu (quase) infalível filme anual, Amant Double, o "artista" Michel Hazanavicius com Le Redoutable e o veterano Jacques Doillon com Rodin. Mas a maior promessa será Robin Campillo, que ainda não teve tempo de dececionar: fez apenas dois filmes e Eastern Boys, o anterior, é magnífico. O novo chama-se 120 Beats per Minute.

 

Murros no estômago e futurologia

 

Entre aqueles que raramente desiludem estão os cotados para atingir aquele píncaro que faz da arte uma experiência visceral. O maior de todos é Michael Haneke que, segundo previsões astrológicas bastante "precisas", vai levar a Palma de Ouro com Happy End: o cineasta é genial, Isabelle Huppert está no elenco e o filme é sobre um campo de refugiados no norte da França.

 

Se tudo correr bem numa segunda-feira potencialmente eletrizante (22/05), os presentes levarão um duplo murro no estômago: a fazer companhia ao austríaco estará Yorgos Lanthimos – que conseguiu segurar a pressão de uma estreia internacional com A Lagosta e agora traz The Killing of a Sacred Deer.

 

I'm afraid of americans

 

 

Da América as propostas circulam entre o indie-nova-iorquino hipster e as falsas promessas de Sofia Coppola. Entre o melhor espera-se Todd Haynes, cujo Wonderstruck tem sessão já amanhã, particularmente porque o último plano de Carol foi iluminado; já Noam Baumbach trás The Meyerowitz Stories e os irmãos Safdie (Benny e Josh) Good Time. Quanto à Sofia Coppola, que devia ir a Cannes escondida numa burca depois de Bling Ring, surge com The Beguiled.

 

Sem Liga dos Últimos

 

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O húngaro Kornél Mundruczó (de Deus Branco) nunca falhou o festival: cinco filmes, cinco presenças. O novo chama-se Jupiter's Moon. Por seu lado o russo Andrey Zuyagintsev, outro habitual, vem da megaunanimidade de Leviathan e aparece com Loveless, enquanto o ucraniano Sergei Loznitsa trás A Gentle Creature.

O naipe de asiáticos é do mesmo patamar de relevância: tem Naomi Kawase (Radiance), Bong Joon Ho (Okja) e Hong Sangsoo (The Day After).

Por fim, mas não menos importante, o sueco Ruben Östlund (The Square) vem do consagradíssimo Força Maior e Lynn Ramsay deixa a incógnita sobre o que virá com You're Never Really Here depois do estupendo Temos que Falar sobre Kevin ser seguido pelo desastre de As Armas de Jane (quando abandonou as filmagens um dia antes de elas começarem). Talvez o grande corredor por fora será o turco Fatih Akin, muitos anos depois do Urso de Ouro do Head-on- A esposa turca.  O projeto chama-se In the Fade.

 

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por Roni Nunes às 18:53

IndieLisboa 2017: crítica a "The Challenge"

por Roni Nunes, Segunda-feira, 15.05.17

Crítica originalmente postada em C7nema (http://www.c7nema.net/critica/item/46631-the-challenge-por-roni-nunes.html)

 

 

No Antigo Regime, e daí para trás, só os ricos mereciam ser retratados. Na pintura, na literatura, na História, os aristocratas, os mercadores/banqueiros, os altos dignatários da igreja eram dignos de registo: o povo desvaneceu-se em séculos de invisibilidade. No século XIX, as coisas começaram a mudar.

 

O cinema é produto da 2ª Revolução Industrial e sempre falou dos pobres. Seja na fantasia, seja no realismo. O de autor, em particular, chafurda há décadas na vida dos desfavorecidos. Fernando Meirelles, depois de um impecável registo da favela (Cidade de Deus) prometeu um filme sobre os muito ricos – cuja visão seria igualmente brutal e chocante. Por alguma razão nunca o fez – como tampouco outros: no cinema realista, os detentores do dinheiro foram remetidos a um perverso e confortável silêncio.

 

The Challenge fala de falcões. Eles têm direito à manicura e um naipe de gente que vive para cuidá-los. Paga-se por um exemplar 22 mil euros num leilão. O Qatar é uma das ilhas da fantasia do Médio Oriente – a terra dos “sheiks”, que fazem o deserto reluzir com suas carrinhas topo de gama. Um deles tem uma lamborghini; com ele viaja o seu jaguar (o animal) de estimação – talvez a mais impressionante mostra simbólica de poder.

 

O italiano Yuri Ancanari expõe em museus e é reconhecido internacionalmente no universo do videoarte. The Challenge é a sua longa-metragem cinematográfica de estreia. Planos fixos, panorâmicas, cores exuberantes, cenários interiores cujos luxos falam mais do que as palavras: o retrato visual da opulência – filmado como álbum de família, com elegância a condizer.

 

Quanto à falcoaria, esta era documentada na mais remota Antiguidade. Consiste em lançar um falcão treinado para, com a ajuda das preces a Alá, destroçar um pobre pombo. Os árabes, há muitos séculos, são dos seus mais entusiasmados praticantes e continua ser a forma de desporto favorito de uma elite que não tem que prestar contas a ninguém. Enquanto o petróleo existir, eles lá estarão; fora da “petrolândia”, a escumalha despedaça-se em statements suicidas pelo Ocidente afora – ao passo que estes últimos acham justificações esdrúxulas para chacinar sociedades em busca do ouro negro.

 

A falcoaria, tal como a opressão, está destinada a perpetuar-se no tempo

 

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por Roni Nunes às 19:41

Curtas-metragens que estiveram em destaque no IndieLisboa

por Roni Nunes, Segunda-feira, 15.05.17

Artigo originalmente postado em C7nema: (http://www.c7nema.net/festival/item/46605-dez-curtas-metragens-a-nao-perder-no-indielisboa.html)

Dez curtas-metragens a não perder no IndieLisboa

POR RONI NUNES

 

 

O formato teve sempre amplo espaço no festival: vários realizadores que estreiam no certame com curtas retornam anos depois quando realizam uma longa. O C7nema foi saber com um dos seus diretores, Miguel Valverde, alguns dos destaques desta edição que é, segundo ele, umas das “mais politizadas de sempre”. O IndieLisboa iniciou quarta-feira (03/05) e segue até 14. As sessões de curtas-metragens iniciam dia 6 (sábado).

 

HOT WINTER: A FILM BY DICK PIERRE

Jack Henry Robbins, EUA, fic., 2016, 18'

Competição

Jack Henry Robbins é filho de Tim Robbins e Susan Sarandon e, segundo Valverde, faz uma espécie de “soft porn” erótica para tratar da temática ambientalista. “Nós percebemos claramente, em relação às personagens, que um deles é o Trump e as mulheres estão relacionados aos escândalos nos quais ele está envolvido”. 

 

DEKALB ELEMENTARY

Reed Van Dyk, EUA, fic., 2016, 20'

Competição

Filme que fala do fenómeno, cada vez mais comum na América, dos homens que entram em escolas armados para atirar em que passar pelo caminho. Em “Dekalb Elementary”, baseado numa história real,  assiste-se 20 de ume tensa negociação entre um destes sujeitas e a secretária, que tenta controlá-lo para não ser morta, ao mesmo tempo que funciona como intermediária nas negociações com a polícia. “É muito contigo, com ótimas interpretações”, assinala o diretor do Indie.

 

NYO VWETA NAFTA

Ico Costa, Portugal/Moçambique, fic., 2017, 21'

Competição

Um dos sinais distintos desta produção portuguesa filmada em Moçambique é evitar o realismo mágico normalmente associado ao cinema africano. Aqui o tratamento é de um tema quotidiano (no centro da história está o desaparecimento de uma mulher) que poderia ter acontecido em qualquer outro país. Premiado no Visions du Reel, já passou por Roterdão e neste momento faz uma importante carreira no circuito de festivais.

 

THE WELFARE OF TOMÁS Ó HALLISSY

Duncan Campbell, Irlanda/Reino Unido, fic./doc., 2016, 30'

Competição

Documentário e ficção ao mesmo tempo, o filme trata do retorno às origens de Duncan Campbell, premiado artista do Reino Unido. Quando decide regressar à sua terra natal, o realizador dedica-se a pensar no que é ser irlandês e comparar o país atual com aquele que deixou e nos anos 70.

 

DER WOHLWOLLENDE DIKTATOR/THE BENEVOLENT DICTATOR

Bernhard Braunstein, Martin Hasenöhrl, Albert

Lichtblau, Áustria/França, doc., 2016, 35'

Competição

O título do filme já é muito sugestivo e conta a história de um judeu foragido do holocausto e hoje vive no Malawi, país que não prima propriamente por um governo democrático. Ocorre que este personagem tem uma bela vida no país, recebendo pensões de Alemanha e Inglaterra e defendendo ideias perturbadoras sobre como é bom viver sob uma ditadura. Como observa Valverde, “é um filme que levanta imensas questões”.

 

115 DB

Lucile Chaufour, França, doc., 2017, 40'

Silvestre

Uma boa sugestão para fanáticos de automobilismo e de motas. O documentário uma prova no estilo das “24 Horas de Le Mans”, só que de motas. “Basicamente estamos nos bastidores a sentir a adrenalina, estamos a ver tudo o que está a acontecer, as mudanças de condutor, as máquinas, os computadores… tudo”.

 

GREEN SCREEN GRINGO

Douwe Dijkstra, Holanda, doc./exp., 2016, 16'

Silvestre

Politicamente é muito interessante, embora à partida possa parecer ingénuo”, diz Valverde desta proposta inusitada. O holandês Douwe Dijkstra foi ao Brasil na altura do golpe da destituição de Dilma e saiu pelas ruas com um “chroma key” a filmar pessoas. Ao mesmo tempo, lança o seu olhar de estrangeiro para tentar perceber o que se está a passar…

 

SEVINCE/WHEN YOU LOVE

Süheyla Schwenk, Alemanha, fic., 2016, 30'

Silvestre

Obra que retrata o amor proibido entre duas mulheres muçulmanas (uma iraniana e outra turca) que vivem na Alemanha. Ambas são casadas. Vivendo num país ocidental elas poderiam, eventualmente, fazer o que quisessem, mas pertencem a um universo mais restritivo nesta área. No caso de uma delas, por exemplo, o rosto só se vê passados dez minutos de filme, pois até mesmo na rua usa a burka.

 

FREMDKÖRPER/TRANSPOSED BODIES

Katja Pratschke, Gusztáv Hámos, Alemanha, fic., 2002, 27'

Silvestre Foco

Entre os projetos da dupla em Foco da secção Silvestre, o diretor do Indie destaca “Tranposed Bodies”, obra livremente inspirada num conto de Thomas Mann (“The Transposed Heads”) que, por seu lado, guarda semelhanças com a história que inspirou “Jules et Jim”. Para completar a mistura, este foto filme é, também, inspirado em La Jetee, clássico de Chris Marker. A história é de dois amigos que perdem, literalmente, a cabeça por uma mulher…

 

KILLING KLAUS KINSKI

Spiros Stathoulopoulos, Colômbia, fic., 2016, 21'

Director's cut

Na seção dedicada a filmes sobre cinema um dos destaques é a curta que vai investigar a história (ou mito…) envolvendo as relações entre o cineasta Werner Herzog e o ator Klaus Kinski durante as filmagens do clássico “Fitzcarraldo”. Reza a lenda que, às tantas farto do comportamento e do constante mau humor do ator, Herzog tenha pensado em matá-lo. Consta que a ideia teve apoio entusiástico dos índios – que ainda foram mais longe e deram a ideia de envenenar uma seta para alvejar o intérprete…

 

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por Roni Nunes às 18:58

IndieLisboa 2017: "Somniloquies"

por Roni Nunes, Segunda-feira, 15.05.17

Sonhos “in loco”

Eventualmente uma das propostas mais radicais deste IndieLisboa, “Somniloquies”, de Lucien Castaing-Taylor e Veréna Paravel, mergulha no universo onírico de um homem que falava enquanto dormia… por outras palavras, é como se as próprias portas do inconsciente fossem abertas.

 

 

Em causa estão os sonhos do cantor nova-iorquino Dion McGregor, que ao longo de sete anos na década de 1960, teve as suas movimentadas noites gravadas por um companheiro de quarto. Ele foi estudado por especialistas e considerado “o homem que mais fala a dormir” no mundo.

 

A seleção de trechos dos seus sonhos revelam muito humor, erotismo e detalhes pitorescos – como a descrição de uma cidade construída e habitada… por anões! 

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por Roni Nunes às 18:51

IndieLisboa 2017: crítica a "Viejo Calavera"

por Roni Nunes, Domingo, 14.05.17

Crítica originalmente postada em C7nema (http://www.c7nema.net/critica/item/46629-viejo-calavera--dark-skull-por-roni-nunes.html)

 

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O longínquo eletrohouse dos Kano embala bolivianas do século XXI. Elder (Julio Cesar Ticoa) tenta beijá-las, mas elas não estão interessadas. Ele terminou de chegar à discoteca depois de ter assaltado um transeunte. Italo-disco/Bolívia/Elder – a delícia kitsch para a abertura de “Viejo Calavera”, longa-metragem de estreia de Kiro Russo.

 

Tempos depois, a quase quatro mil metros acima do nível do mar uma alma penada chora pela montanha o filho morto. Sombras movem-se nas montanhas gélidas onde há criação de lhamas e uma pequena cidade sobrevive ao redor da mina de estanho. Huanuni.

 

Elder tem de voltar para lá. Ele é um dos protagonistas de filme mais moralmente inúteis já vistos por aí: passa a vida bêbado, a cometer furtos e a arranjar confusão. Sua tia da cidade já não o atura e, ao voltar para Huanuni, vai parar as catacumbas da cidade – a substituir o seu pai recém-falecido e, diferente dele, muito admirado pelos outros mineiros.

 

Esse filho pródigo vai perambular pelos labirintos sufocantes das minas. Com a sua displicência e uma incrível atitude “que se f* tudo e todos”, embriagado a uns bons quilómetros abaixo da terra firme, a sofrer acidentes irresponsáveis, ele não pode despertar nada melhor do que o ódio dos “compañeros”. Seu padrinho Francisco diz: “filho, toda a gente tem que tomar um rumo um dia” – palavras que entram a 10 e saem a 1000.

 

Os mineiros do mundo real ajudaram a financiar o filme do realizador boliviano Kiro Russo – a que aprendeu a fazer cinema na Argentina. Eles próprios estão lá, como atores não profissionais à boa maneira neorrealista, a protestar contrato o completo descaso do Estado para com uma vida dura.

 

O “dark” do título internacional (“dark skull”) é a palavra para a trajetória de Elder e seus colegas – a moverem-se (com o contraponto na imagem pela cinematografia de Pablo Paniagua) num território pleno de dificuldades laborais e existenciais. O filme peca, no entanto, pela história demasiado obtusa contada por Russo e por seu coargumentista Gilmar Gonzáles – onde nota-se que o maior esforço (e talento) está investido na composição visual e sonora.

 

 

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por Roni Nunes às 19:11

IndieLisboa 2017: "A Cidade do Futuro"

por Roni Nunes, Domingo, 14.05.17

Artigo originalmente postado em SAPO MAG (http://mag.sapo.pt/cinema/atualidade-cinema/artigos/diario-do-indielisboa-a-cidade-do-futuro-e-outros-destaques?artigo-completo=sim)

 

 

O “Halloween” chegou aos remotos confins do interior do Brasil. O que não o acompanhou foi a “modernidade dispensável” – aquela que vai aos fundamentos da estrutura patriarcal-cristã, intrinsecamente homofóbica.

 

Por isso não será uma grande ideia estabelecer um triângulo amoroso à vista de todos. Especialmente se for entre dois homens homossexuais e uma mulher grávida de um deles.

 

Mas é o que fazem os protagonistas de “A Cidade do Futuro”, Gilmar (Gilmar Araújo), Igor (Igor Santos) e Milla (Milla Suzart) em mais um registo de docuficção. Cada um à sua maneira vão enfrentar as diferentes reações de desprezo, silêncio, ódio e violência, da família e da população local.

 

A proposta dos realizadores Cláudio Marques e Marília Hughes entrelaça a trajetória do trio com as próprias origens traumáticas (e verídicas) da cidade onde se passa a ação – local surgido após uma enorme imigração forçada durante a ditadura para construção de uma barragem.

 

Trabalho bastante mais cadenciado do que o dinâmico “Depois da Chuva” – a obra anterior onde a dupla falava de jovens, anarquismo, luta contra o regime militar e outro momento marcante da história do Brasil, a transição para a democracia nos anos 80.

 

Dada a força que vem reencontrando os discursos de ódio primitivo, a existência de “A Cidade do Futuro” é um manifesto por si – e cujo título fornece um comentário para um passado de enormes mentiras e um futuro que ainda não chegou.

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por Roni Nunes às 17:27

IndieLisboa 2017: "Werewolf"

por Roni Nunes, Domingo, 14.05.17

Artigo originalmente postado em SAPO MAG (http://mag.sapo.pt/cinema/atualidade-cinema/artigos/diario-do-indielisboa-werewolf-e-outros-destaques?artigo-completo=sim)

 

 

Um casal e um cortador de relva. Nos dias difíceis em que a metadona pode ou não aliviar o processo de desintoxicação, eles testam os limites dos serviços sociais enquanto cortam relva aqui e ali. Enquanto não se cansam de um duro processo físico, enquanto a própria máquina não os abandona. Vivem numa roulotte, andam sujos.

 

Mas os processos não são iguais para Vanessa (Bhreagh MacNeil) e Blaise (Andrew Gillis). Em algum momento ela parece agarrar-se aos fiapos do momento presente – com o cabelo preso na loja dos gelados. Blaise continua a tremer e a arrastar-se como um “zombie” – com ideação suicida suspensa sobre a sua cabeça nesta espécie de versão canadiana para “Oslo 31 de Agosto”.

 

O filme norueguês trazia uma reconciliação impossível com o mundo tornado insuportavelmente vazio depois do abandono da droga; em “Werewolf” a ligação com a realidade, num lugar vagamente indistinto e num tempo onde a cronologia parece já não existir, é mais ténue.

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por Roni Nunes às 17:19


Comentários recentes

  • Cleber Nunes

    Sem dúvida é um filme que me despertou interesse ...



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