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Renaud Monfourny: "A forma como os jovens hoje consomem cultura é assustadora"

por Roni Nunes, Sábado, 30.09.17

Artigo originalmente postado em SAPO MAG: http://mag.sapo.pt/cinema/atualidade-cinema/artigos/renaud-monfourny-a-forma-como-os-jovens-hoje-consomem-cultura-e-assustadora)

 

Renaud Monfourny: "A forma como os jovens hoje consomem cultura é assustadora"

 

O fotógrafo da revista francesa de culto "Les Inrockuptibles" esteve em Lisboa para uma exposição fotográfica no âmbito da Festa do Cinema Francês e conversou com o SAPO Mag sobre cultura, festivais de música, crítica de cinema e, certamente, fotografia.

 

Foto: Roni Nunes

 

Em Lisboa, a Festa do Cinema Francês decorre entre 5 e 15 de outubro. Uma das atividades paralelas já está a decorrer: a exposição de fotografias de Renaud Monfourny, fotógrafo da revista de culto francesa Les Inrockuptibles.

 

Num ameno final de tarde, o SAPO Mag foi até a Plataforma Revólver [rua da Boavista, 84] para ver as fotos da coleção “Lights, Camera, Action!” e ter uma conversa sobre o estado das coisas na cultura atual…

 

A exposição reúne fotografias a preto-e-branco selecionadas diretamente para a Festa do Cinema Francês. São apenas algumas de uma carreira de mais de 30 anos e uma produção de cerca de 40 novos trabalhos por mês. Além de artistas do cinema do seu país, no entanto, o fotógrafo escolheu algumas surpresas.

 

“Recordei que Portugal é um país forte em termos de cinema e decidi fazer uma pequena homenagem incluindo alguns dos seus protagonistas”, diz.

 

Assim, pelas paredes da casa de artes é possível encontrar “poses” de Rita Blanco, João Pedro Rodrigues, Manoel de Oliveira, Pedro Costa.

 

O envolvimento de Monfourny com a fotografia começou no final dos anos 70, mas um dos momentos marcantes foi, certamente, a fundação da revista Les Inrockuptibles, em 1986. Como em tantos outros países, ela surge durante a febre do 'indie rock' britânico que, conforme conta, ainda não circulava em França. Foi num contexto de efervescência cultural, amparada em ícones como The Smiths, New Order, The Cure e tantos outros, que a revista cresceu.

 

Foi acompanhada por diversas empresas jornalísticas que, no entanto, já não existem. Por que a "Les Inrock", conforme a alcunha, sobreviveu?

 

"Bom, um dos motivos foi que simplesmente não se pagou ninguém durante uns dois anos! Depois houve um momento fundamental quando a Fnac, que achou o conteúdo muito bom, decidiu vendê-la nos seus estabelecimentos", tornado desta forma a publicação um dos veículos de referência do público de música e cinema alternativos.

 

A música e o hipermercado da dispersão

 

Hoje em dia, olhando em retrospetiva, tudo parece muito diferente. Para quem viveu a juventude nos anos 80, curiosamente considerada na altura “decadente” em relação às anteriores, causa desconforto ver o consumo indiscriminado de música no século XXI.

 

Monfourny mostra-se perplexo: "É assustador. Hoje com a internet consume-se indiscriminadamente de tudo, não há um caminho, não há uma consciência em relação ao que se ouve. É só consumo, aleatório e disperso. Se for preciso a mesma pessoa ouve Rihanna e diz 'fixe'; se por puro acaso lhe calhar um Sex Pistols, também vai dizer o mesmo. Antigamente isso era impensável!” [risos].

 

A música está por todo lado e a internet é um grande supermercado repleto de “marketing” invisível. E nada espelha melhor esse estado de coisas do que os grandes festivais.

 

"Eles são a pior parte da minha profissão. Aquilo junta uma infinidade de gente que está lá para comer, beber, cuja banda não vem porque está longe e nem ouvem direito porque o som está horrível. Não tem interesse, é apenas consumo", garante.

 

A crítica de cinema

 

Na grande pátria da crítica de cinema, da 'Nouvelle Vague' e dos Cahiérs du Cinéma, a 'Les Inrock' achou o seu nicho. Segundo Monfourny, de forma muito menos elitista do que frequentemente se supõe.

 

 

"Há lá críticos capazes tanto de bater em filmes independentes ‘mauzinhos’, que não são bons apenas por serem ‘indies’, como gostar de um ‘blockbuster’ de Hollywood. Houve um amigo que foi agredido na rua por ter chamado ‘O Fabuloso Destino de Amélie’ [2001, de Jean-Pierre Jeunet] de ‘coleção de cartões postais de Paris’! [risos]

 

Ainda segundo o fotógrafo, em França a tendência é dizer bem de tudo que é pequeno e falar mal do que é 'mainstream'.

 

“Há muitos artistas que depois de elogiados pelos críticos repetidamente transformam-se numa espécie de ‘mainstream’ para os ‘indies’”, conclui.

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por Roni Nunes às 11:46

Fórum Fantástico reúne amantes das artes em Lisboa

por Roni Nunes, Sexta-feira, 29.09.17

Artigo originalmente postado em SAPO MAG (http://mag.sapo.pt/showbiz/artigos/forum-fantastico-reune-amantes-das-artes-em-lisboa?artigo-completo=sim)

 

Fórum Fantástico reúne amantes das artes em Lisboa

O Fórum Fantástico decorre entre 29 de setembro e 1 de Outubro na Biblioteca Orlando Ribeiro em Telheiras. O convidado especial é escritor e argumentista de BD Mike Carey, que já trabalhou em “X-Men”, “Batman”, “Sandman”, “Lúcifer” e muitos outros.

 

 

A ficção como elemento fantástico abrange praticamente todas as formas de arte, com milhões de fãs em todo o mundo.

 

Em Portugal, o Fórum Fantástico reúne durante três dias artistas, produtores culturais e fãs do género para uma série de palestras e “workshops” em áreas como literatura, banda desenhada, cinema, música e música, entre outras.

 

O programa inclui  também diversas atividades para crianças e todos os eventos têm entrada gratuita.

 

 

A presença especial este ano cabe a Mike Carey, argumentista com uma vasta carreira na BD, que participará de eventos sobre a sua obra na sexta e no sábado. Trabalhou em números de “X-Men”, “Batman”, “Sandman” e “Lúcifer”, entre muitos outros, e na literatura – área na qual publicou diversos romances.

 

O SAPO Mag conversou com os organizadores, em nome da Épica – Associação Portuguesa do Fantástico nas Artes, Rogério Ribeiro e João Morales.

 

O Fórum Fantástico vai para a sua 11ª edição. O que podem contar sobre a sua criação e o percurso ao longo destes anos?

 

Rogério Ribeiro – O evento nasceu realmente em 2004, fruto de um grupo de amantes de literatura fantástica. O objetivo era propiciar uma ocasião anual onde este tipo de obras pudesse ser apresentado e debatido e que os leitores e os estudiosos pudessem interagir diretamente com os escritores.

 

O evento, realizado na Faculdade de Letras de Lisboa, que não foi uma escolha fortuita, correu tão bem que o Fórum Fantástico nascia logo no ano a seguir. Desde o início ele assumiu a sua vocação internacional e congregadora de vários meios e subgéneros.

 

De um lado estava a ficção científica, a fantasia, o horror, o fantástico e, de outro, a literatura mas também o cinema, a banda desenhada, a música, as artes plásticas e performativas, os videojogos e jogos de tabuleiro, o modelismo, etc. Somos naturalmente ecléticos e gostamos que isso se reflita na forma como o Fórum Fantástico é organizado e programado.

 

Claro que todos estes anos já incluem um historial considerável de pequenos episódios. Trouxemos escritores como Nick Sagan, a quem toda a gente perguntava por histórias do pai, e organizamos a primeira vinda do George R.R. Martin a Portugal, ainda antes do sucesso da série televisiva "A Guerra dos Tronos" – o que proporcionou uma estadia bem mais calma do que as posteriores. Através de esforços diplomáticos também alcançámos a atribuição do visto ao sérvio Zoran Zivkovic.

 

Todos os anos temos tido desafios que nos dá gozo ultrapassar, o que fiz em conjunto com a Safaa Dib durante vários anos e, mais recentemente, a par com o João Morales.

 

João Morales – Esta é a edição mais ambiciosa no que respeita ao aproveitamento dos diversos espaços desta magnífica biblioteca. Vamos ter atividades no auditório, nas salas de leitura, nos espaços infanto-juvenis, na fonoteca, no pátio interior ao ar livre…Os “workshops” direcionados a crianças e jovens são também uma nova aposta, alargando o leque de possíveis interessados e estreitando relação com a comunidade local de Telheiras – desde logo nas suas camadas mais jovens.

 

Portanto uma das ideias centrais do Fórum é esta interdisciplinaridade…

 

Rogério Ribeiro – Sim, a programação do Fórum Fantástico é um exercício de abrangência, tomando o Fantástico precisamente como o ponto central. Afinal de contas, se não for a capacidade de Imaginar a unir-nos, nenhuma outra coisa o fará.

 

Quanto aos espaços, nesta edição ocupamos todos os cantos da casa… É notório o aumento e disseminação das atividades, entre os dois edifícios que constituem a Biblioteca e o Auditório, assim como pelos dois pátios. Aliás, com o apoio da Junta de Freguesia do Lumiar foi possível trazer a feira do livro para o exterior, e desafogar o exíguo foyer do auditório, cujos engarrafamentos se tornaram míticos no Fórum Fantástico.

 

João Morales – É muito importante desmistificar a ideia de que os amantes da literatura não se interessam por música, os cinéfilos não querem saber de artes plásticas ou os melómanos não lêem ficção. Todos somos seres complexos que procuramos em diferentes formas de expressão a materialização das nossas afinidades e anseios.

 

Por que acham que o elemento Fantástico alcança essa abrangência?

 

Rogério Ribeiro – Uma obra fantástica pode ter tanto elementos de escapismo como de reflexão. Atrevo-me a dizer que a boa ficção tem ambos! De resto, possui propriedades e regras que são transversais a todos os meios criativos.
O facto de alguns criadores não compreenderem que o fantástico não é uma carta-branca para o “vale-tudo”, mas, pelo contrário, é um género cujo sucesso depende ainda mais de regras – e sim, isso inclui respeitá-las e subvertê-las –, é o que explica alguma incompreensão e atrapalhação quando se tenta aproximar uma obra ao fantástico. Por isso também se torna um género mais complexo de consumir.

 

João Morales – O fantástico, a ficção científica, até mesmo muitas das histórias de terror, acabam por ocultar uma abordagem a diversas dimensões da condição humana, da mesma forma que as mitologias são, quase sempre, uma incursão pelas possibilidades que a alma humana acolhe.

 

Além disso, muitos dos temas que poderiam parecer fantásticos há alguns anos hoje são da mais evidente atualidade. Veja-se, por exemplo, o debate que vamos ter em torno da Inteligência Artificial e compare-se com as notícias que dão conta de discussões internacionais ao mais alto nível sobre a criação de uma personalidade jurídica para robôs.

 

Em termos de produção, acham que o fantástico em Portugal tem uma saída melhor na literatura e na BD do que no cinema? Como é que avaliam essa produção?

 

Rogério Ribeiro - Num dos painéis do Fórum Fantástico deste ano desaprovamos essa ideia com três exemplos portugueses de longa-metragem de cinema fantástico – assim como demonstramos a capacidade de internacionalização dos poucos, mas bons.

 

Aliás, penso que a banda desenhada está a atravessar uma fase particularmente profícua, com o cinema a manter-se com bons exercícios. Já a literatura fantástica, na sua expressão portuguesa, tem decaído em relação há alguns anos.

 

E quanto aos seus melhores executantes, até tem vivido mais de reedições do que de obras originais. Mas surpresas também têm acontecido, como, por exemplo, uma pequena editora como a Divergência a trazer o António de Macedo de novo aos originais publicados!

 

O que é a parceria com a Liga Steampunk?

 

Rogério Ribeiro – A parceria com a Liga Steampunk nasceu da vontade de, mais do que integrar algumas atividades “vaporpunk” na programação, contribuir para o ressuscitar da EuroSteamCon Portugal. Aliás, para mim não é novidade, dado ter feito parte, com a Joana Lima, Sofia Romualdo e André Nóbrega, da organização da primeira ESC, em 2012, no Porto. Daí também o lado afetivo para com essa iniciativa.

 

Quando abordei a Liga com a ideia, constatei que eles próprios partilhavam dessa ambição. Então foi rápido montarmos. É gente dinâmica, bem vestida, e a respeitar a hora do chá, é o que se quer!

 

Também prevêem muitas atividades para crianças…

 

Rogério Ribeiro – Sim, este ano, desafiados pela BLX e pela própria Biblioteca Orlando Ribeiro, focamos parte da programação nos mais novos e aqui também foi preciosa a colaboração da Liga Steampunk e do Especulatório. De jogos à escrita, de modelismo a impressão 3D, muito haverá para entreter as crianças. Mas os adultos continuam a beneficiar da fatia de leão, com três dias repletos de palestras e “workshops”.

 

A programação completa pode ser encontrada em forumfantastico.wordpress.com.

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por Roni Nunes às 20:41

Festival Olhares do Mediterrâneo: Outro olhar para emigração e racismo

por Roni Nunes, Quinta-feira, 28.09.17

Artigo originalmente postado em SAPO MAG (http://mag.sapo.pt/cinema/atualidade-cinema/artigos/festival-olhares-do-mediterraneo-outro-olhar-para-emigracao-e-racismo?artigo-completo=sim)

 

Festival Olhares do Mediterrâneo: Outro olhar para emigração e racismo

O evento decorre no cinema São Jorge, em Lisboa, entre 28 de setembro e 1 de outubro, onde serão exibidos 52 propostas cinematográficas oriundas dos países ao redor do Mar Mediterrâneo. Uma série de atividades paralelas acompanha a mostra.

 

 

São 52 os filmes que compõem a 4ª edição do Olhares do Mediterrâneo, cuja programação inclui debates, “workshops”, performances, exposições e um concerto.

 

Os realizadores de alguns dos trabalhos exibidos estarão em Lisboa para as respetivas sessões e na organização está o grupo Olhares do Mediterrâneo e o Centro em Rede de Investigação em Antropologia (CRIA).

 

Sobre este evento de temática regional que decorre num momento de fragmentação europeia, o SAPO Mag conversou com a diretora, Sara David Lopes.

 

No ano passado vocês salientavam a necessidade de criar uma alternativa ao discurso etnocêntrico – do qual árabes e muçulmanos são as maiores vítimas neste momento. Neste sentido era importante a secção Travessias, que pressegue. Passado um ano esse discurso está cada vez mais forte e até elegeu um presidente de um país como os Estados Unidos. Como vêem o vosso evento neste cenário global?

 

O reforço desse discurso etnocêntrico vem paradoxalmente salientar a importância de preservar espaços de desconstrução como o nosso Festival. Nessa medida, este ano pretendemos ir ainda mais longe com a nossa secção Travessias, mergulhando as suas raízes em momentos do passado que atestam a transversalidade temporal e geográfica destes desencontros que nos afastam.

 

É comovente, no entanto, observar que - no plano individual - em momentos de grande tensão social é possível encontrar fortes laços de solidariedade e cooperação que transcendem tendências políticas ou coletivas. Isso reforça a nossa convicção de que eventos como o festival podem contribuir de uma forma muito positiva para criar uma mudança de mentalidades, aproximando-nos do outro e vendo nele o nosso espelho na sua humanidade.

 

O vosso projeto também vai, de certa forma, na contramão de um processo histórico, uma vez que é agregador e inclusivo. A tendência na Europa é de desagregação, de nações fechadas num individualismo defensivo. Na região mediterrânica há o caso da Catalunha, que luta na justiça por um plebiscito pela separação.

 

O individualismo defensivo que caracteriza a Europa atual decorre de um sentimento que cerra fileiras contra o desconhecido, contra aquilo que, por ser diferente, é percebido como uma ameaça. Uma forma de o combater é demonstrar que a diferença é aglutinadora, enriquecedora e plural e entendemos que também aqui podemos dar um contributo, promovendo uma abertura que nos permita ver no outro aquilo que nos aproxima ainda que sejamos seres humanos distintos e diversos.

 

O caso catalão corresponde, em última instância, a um sentimento identitário muito forte, com raízes bem consolidadas que, não tendo o mesmo tipo de origem que estes movimentos mais atuais de retração, pela sua coexistência temporal contribuem para uma sensação genérica de um certo "salve-se quem puder" e de um virar as costas para o exterior.

 

 

O que podem dizer sobre a escolha do filme de abertura, "The Nurse" [foto em cima], e de encerramento "Willy 1er" [ao lado]?

 

No quadro das temáticas presentes este ano no festival, fez-nos sentido abrir com um filme que fala do direito inalienável à liberdade e da luta pela nossa realização enquanto seres plenos. Nesta encruzilhada de duas vidas - um prisioneiro político em greve de fome e uma enfermeira vítima de violência doméstica - Leila encontra neste espaço físico em que Kerem está encarcerado a força e a coragem para se libertar duma existência em que a sua maior limitação é imposta por si mesma. Kerem vê em Leila uma forma de fazer perdurar a sua existência e memória pelo exercício da liberdade de pensamento, a única que não lhe podem tirar. "The Nurse" revela-nos um encontro libertador e transformador, alinhando-se com aquilo que pretendemos que o festival seja.


"Willy 1er" vem, por sua vez, encerrar o festival com um tema que também nos é querido: o da inclusão e do direito a todos os indivíduos de perseguir os seus sonhos e lutar pela concretização das suas mais íntimas aspirações, não se deixando tolher por constrangimentos e limitações externas ou internas. Willy, um homem socialmente inadaptado e portador de algumas limitações, decide aos 50 anos deixar o ambiente protegido da casa dos seus pais e ir viver sozinho e procurar o seu lugar no mundo.

 

Querem destacar mais alguns projetos?

 

Não podemos deixar de destacar a secção nova deste ano, Começar a Olhar. Este espaço programático pretende dar mais visibilidade aos trabalhos feitos em contexto de aprendizagem. De cerca de 80 candidaturas, escolhemos 15 filmes que representarão aquilo que, de alguma forma, vai preocupando, intrigando ou seduzindo a nova geração de cineastas do Mediterrâneo. A secção é competitiva e tem um júri próprio.

 

Mantemos as sessões para as escola e uma programação paralela variada que pretende complementar de forma mais ou menos lúdica - que vão dos “workshops” aos debates, passando por exposições e música - a exibição dos 52 filmes que selecionamos para esta quarta edição.

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por Roni Nunes às 21:32

Motelx 2017: rescaldo final e "It"

por Roni Nunes, Terça-feira, 26.09.17

Artigo originalmente postado em C7nema (http://www.c7nema.net/festival/item/47087-motelx-2017,-a-machadada-final-o-melhor,-o-pior-e-o-filme-do-palhaco.html)

 

Motelx 2017, a machadada final: o melhor, o pior e o filme do palhaço

  • Publicado por  Roni Nunes

 

Terminou ontem (10/09) mais uma edição do Motelx. O C7nema propôs ao longo da última semana uma série de artigos sobre filmes de terror e conclui com um rescaldo do que por lá se passou.

 

Do Melhor: Machadadas no pescoço

 

A rica história do cinema de terror e a parceria ibero-americana através de “O Estranho Mundo do Terror Latino” trouxe: “El Vampiro”, bela fantasia mexicana no ocaso da tradição gótica; “À Meia-Noite Levarei a sua Alma”, o cartão de visitas do satanismo sádico de Zé do Caixão; “Quien Puede Matar a un Niño”? – um passo adiante na vilania infantil com terror atmosférico e um incrível final à “catanada”.

 

Meia-Noite Levarei Sua Alma (1964)

 

Dois nonagenários certamente abrilhantaram a edição. Um causou o furacão Jodorowsky (entrevista brevemente): filas pela Avenida da Liberdade para a sessão de autógrafos do mestre chileno – enquanto o surrealismo sangrento de filmes tantas vezes copiado, como “Santa Sangre” e “El Topo”, passaram pelos ecrãs.

 

Roger Corman também andou pelo São Jorge, no dia 6. O homem em si é um património do cinema americano; pelos ecrãs passaram o estupendo “The Masque of the Red Death” e o singular “X: The Man with the X-Rays Eyes”.

 

Por Lisboa andaram autores de trabalhos inestimáveis de recuperação da memória cinematográfica: Daniel Bird acompanhou o processo de restauração das obras do grande Walerian Borowczyk e escreveu um livro onde recupera até o vasto trabalho de pintor e ilustrador do artista; Tiago Monteiro investiu na “Boca do Lixo”, produção exploitation dos anos 70 de São Paulo (Brasil), acompanhado da exibição do icónico “Excitação”, de Jean Garrett; Kim Newman trouxe o seu estatuto e o facto de ter sido, nos 80, um dos principais nomes a tornar o terror um objeto académico em livros como “Midnight Movies”.

 

O que todos eles têm comum é o facto de terem sido entrevistados pelo C7nema: brevemente num ecrã perto de si.

 

X: The Man with the X-Ray Eyes (1963)

 

66 Machadadas

 

66 filmes e cem sessões tornam dura a vida do comum dos mortais num festival de cinema. Entre o melhor do que por lá passou do cinema recente: a poesia do claustro de Cate Shortland (“Berlin Syndrome”), o humor com comentário social de Alex de la Iglesia (“El Bar”), o terror com ação frenética e muuuitos zombies em “Train to Busan”; um palmo abaixo houve a nostalgia de “Boys in the Trees”, a trip distópica de “The Bad Batch”, o gore oitocentista de “The Void”, a visão feminina da era vitoriana de “The Limehouse Golem”, as narrativas paralelas de “Killing Ground”, a monstruosidade como um facto do quotidiano em “The Hounds of Love”, as sutilezas do ocultismo de “A Dark Song”.

 

Golpe de canivete: a curta-metragem vencedora

 

Os cuidados superiores de produção renderam a “Thursday Night”, de Gonçalo Almeida, o prémio de Melhor Curta-Metragem portuguesa. Com muita música ambiente (o filme é inspirado em Brian Eno; o realizador é coautor da banda sonora) e jogos de luzes, constrói-se uma recriação de algumas convenções do cinema de terror com um protagonista canino; peca por ser tão fantasmagórico que até a sua história (que era…?) se desvanece no etéreo.

 

Cold Hell (2017)

 

Faca na árvore: o “melhor” europeu

Mas se no caso acima fica a promessa, mais questionável é o prémio de Melhor Filme Europeu concedido a “Cold Hell”, do austríaco Stefan Ruzowitzky. Há atrocidades em escala suficiente, ainda que nem sempre credíveis, para (tentar) individualiza-lo na massa de filmes americanos com crimes ritualizados, vinganças à cacetada e perseguições de carros (ainda que particularmente aparatosas).

 

Mas o seu traço mais original está no enquadramento temático – e aqui entra-se numa galáxia nebulosa: o assassino em série é um fanático muçulmano; a heroína é uma turca abusada pelo pai (muçulmano); a mãe é omissa e ela busca refúgio na casa de um policia alemão racista. Para “compensar” essas demonstrações de um tradicionalismo espúrio, a prima da protagonista é promíscua, uma maneira tosca de insinuar que ela era “liberal” à maneira do Ocidente – seja o que isso for. Enfim, o que toda essa dubiedade traz, independente de como se queira ler o filme, é uma certa leviandade.

 

Super Dark Times (2017)

 

Faca na água: o filme de abertura

 

A sessão de abertura é uma experiência particularmente coletiva e não combina com a escolha um filme intimista que, eventualmente, poderia ser melhor apreciado em circunstâncias favoráveis. Como foi, a visualização de “Super Dark Times” transformou-se num exercício algo penoso na medida que todo o esforço do realizador Kevin Phillips consistiu em eliminar qualquer clímax. Quando muda de ideias, no final, muita gente (incluindo aquele que escreve) já deixou de se importar.

 

Episódio final: palhaçadas

 

E já que se está no terreno das lâminas é preciso abrir a golpes potentes o caminho até “It”, o objeto fílmico; toneladas de dólares/euros já foram gastos, aliados a todas as macaquices engendradas pelos departamentos de marketing, para o torna-lo uma sensação. Começando pelo pior: os clichés da banda sonora e os “jump-scares” são os signos universais com os quais Hollywood comunica com as massas de espectadores casuais a quem destina as suas produções terroríficas. Estão lá – mas nada a ver com os abusos de “Annabelle 2”, seu imediato antecessor.

 

It (2017)

 

Mais nada a apontar. A tecnologia confere amplos poderes aos “designers” informáticos do palhaço Pennywise; há “zombies”; Andy Muschietti abandonou Modigiliani (“Mamã”) e foi para Munch (a semelhança de “O Grito” com a mulher que sai do quadro); há um assombroso momento splatter a abrir: o palhaço dançarino não veio para fazer sorrir. Mas dá para rir: mais que comic reliefs de ocasião, os momentos cómicos são de uma graça orgânica.

 

Os “losers”, grupo de seis crianças, estão cercados: a cidade está “amaldiçoada”, os meninos mais velhos são os mais completos escroques, os adultos são ausentes ou pouco recomendáveis; há bullying, abusos sexuais, chantagem emocional, a dor da perda e a culpa. Mais que um filme para as pipocas, proposta e execução concretizam um belo e aterrorizante conto sobre a incomunicabilidade da infância – a qual só a “irmandade” dos “losers” pode atenuar.

 

Aproveitem o verão, miúdos...

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por Roni Nunes às 23:51

Motelx 2017: os 10 melhores filmes de Roger Corman

por Roni Nunes, Terça-feira, 26.09.17

Galeria disponível em SAPO MAG - http://mag.sapo.pt/cinema/atualidade-cinema/fotos/motelx-os-10-melhores-filmes-de-terror-do-mestre-roger-corman

 

OS DEZ MELHORES FILMES DE TERROR DE ROGER CORMAN

 

O produtor/realizador estará no Motelx – que decorre entre 5 e 10 de setembro. O SAPO MAG foi revisitar as obras do artista, famoso pelos seus milagres artísticos a partir de orçamentos insignificantes e prazos reduzidos e apostar num Top que ainda deixa de fora trabalhos como “The Premature Burial” e “The Tomb of Ligeia”. Corman trabalhou a maior parte do tempo com a American International Pictures (AIP) e, para além dos inúmeros talentos que depois brilharam na Nova Hollywood, teve uma grande equipa de argumentistas (Richard Matheson, Charles Griffith, Charles Beaumont), diretores de arte (Daniel Haller) e de fotografia (Floyd Crosby, Nicolas Roeg). Também profícua foi a colaboração com Vincent Price, que entrou nos oito filmes do ciclo inspirado em Edgar Allan Poe.

 

 

10 THE RAVEN (1963)

 

O famoso “nevermore” do poema de Poe serve para inspirar a última piada do filme; cansados de terror, Richard Matheson e Corman valeram-se do sucesso dos momentos de comédia de “Tales of Terror” para fugir dos modelos macabros. Mais que comédia negra, aposta francamente no absurdo até chegar, claro, ao “duelo” entre os dois grandes mágicos – Vincent Price e Boris Karloff. Peter Lorre (no papel-título!) completa este Grande Triunvirato da História do Terror.

 

 

9 THE UNDEAD (1957)

 

Um dos melhores esforços de Corman no terreno do “extreme low-budget” com que trabalhava em início de carreira. A AIP atirava para todos os lados e alvo aqui é a “febre” da reencarnação despoletada por caso mediático da altura. Sem se levar muito sério, Corman e seu colaborador mais dado ao humor, Charles Griffith, investem numa movimentada história de “regresso ao passado” que inclui Mefistófeles, feiticeiras, enterramentos vivos, cadáveres para todos os gostos, anedotas diversas e até uma literal “dança macabra”…

 

 

8 THE MAN WITH THE X-RAY EYES (1963)

 

Uma pausa no ciclo poeniano para o dia-a-dia das ruas da metrópole. Um médico (Ray Milland) desenvolve um produto que o faz ver “além” das aparências iniciais. A era dos “cientistas loucos” caminha para a extinção; se o começo parece igual a dezenas de filmes feitos nos 30, 40 e 50 o resto estabelece o projeto mais singular do cineasta. Da ciência para o campo místico – não religioso nem moral, “X” atravessa por circos, mercadores e curandeiros. Corman teve dúvidas ao embarcar para esta viagem: se os recursos técnicos falhassem, o espectador seria enganado. O “Spectorama” (conjunto de recursos óticos) deu à volta a situação, enquanto o final, diferente de outros tempos, demonstra uma visão social muito mais “dark”. Ao que parece os anos 60 não foram “tão dourados” quanto isso…

 

 

7 THE LITTLE SHOP OF HORRORS (1960)

 

Quem esquecerá uma devoradora planta falante desesperada por sangue – especialmente quando as suas palavras geralmente se resumem a um sonoro e ardiloso “feeeed meeee!!!”? “Cult classic” absoluto – com a dupla Griffith/Corman repetindo algumas das ideias de “A Bucket of Blood” (o inadaptado que vira assassino por acaso, o ganancioso que o encobre por dinheiro, ainda que apavorado, o amor platónico do protagonista etc.) para tornar um rumo quase delirante e a beirar o burlesco “chapliniano”.

 

 

6 THE TALES OF TERROR (1962)

 

O original de “The Black Cat” incluía alcoolismo, assassinatos, ocultação de cadáver; inspira (com uma engenhosa inclusão de “The Cask of Amontillado”) o maior dos três episódios de “The Tales of Terror”. No meio desta macabra história há uma impagável cena de humor: Vincent Price, pomposo e efeminado, faz um duelo de degustação de vinho com Peter Lorre – que, apesar de ingerir como um alarve qualquer bebida que se lhe pusessem à frente, sabia diferenciar alhos de bugalhos. Há ainda a mais solene abordagem de “Morella”, abusando da “teia de aranha” para simbolizar o ostracismo do protagonista, ou da degradação cadavérica de “The Strange Case of Mr. Waldemar”.

 

 

5 A BUCKET OF BLOOD (1959)

 

Era fácil ser cínico com a pseudociência (“The Undead”) – mais temerário era ironizar os costumes da prestigiosa geração “beat” na aurora da contracultura. Dick Miller vive um empregado de balcão ingénuo e burro que, ao matar um gato por acidente e cobri-lo com argila, é “descoberto” como um grande artista. Para manter o estatuto, no entanto, precisa arranjar mais “matéria-prima”… Uma cruel demolição da vida dos artistas (a pomposidade, as vaidades, as contradições) misturado com assassinatos em série. Ou, como diz o poeta, que “as suas mesquinhas mortes sejam argila para as suas mãos!”. A salientar apenas que, ao contrário do que diz Corman na sua autobiografia, ele NÃO inventou com esse filme as “comedy horrors” – que já existiam desde os anos 20.

 

 

4 THE HAUNTED PALACE (1963)

 

O mercantilismo da AIP inseriu o filme no ciclo Poe, mas a origem é outra – H.P. Lovecraft. Certamente tem Price assolado por uma maldição (com abertura semelhante a de “La Maschera del Demónio”, clássico de três anos antes de Mario Bava); ela foi lançada pelo seu próprio antepassado, dado a feitiçarias, Joseph Curwen (também Price, obviamente). Este último não tenta apenas apossar-se do corpo do seu inocente herdeiro que observa o seu quadro na sala; antes de morrer um século antes lançou votos de infelicidade eterna sobre todo o vilarejo que o condenou. Entre “fogs” e ruas pouco distinguíveis, aterradores mutantes dão ao filme um tom distinto dos outros projetos do ciclo.

 

 

3 THE PIT AND THE PENDULUM (1961)

 

Uma cópia não tem de ter caráter pejorativo; “House of Usher” definiu os parâmetros, “The Pit and the Pendulum” expandiu-os. Até a mobília do primeiro transitou para recriação no segunda. A ideia inicial é a mesma: um cenário requintado esconde caves (e instrumentos de tortura, neste caso) com raros vislumbres externos. Isso significa novamente os ricos interiores de Haller e os temas pertencentes ao coquetel “poeniano” habitual – com seu protagonista (Price novamente) torturado pela culpa e à beira da desintegração, mais enterramentos vivos e sequências oníricas. Trás ainda um apelo extra – uma pequena participação da musa terrorífica dos 60s, Barbara Steele. O “twist” final é uma pérola de perversidade mórbida.

 

 

 

2 HOUSE OF USHER (1960)

 

Corman percebeu que o mercado de “drive-ins” dos 50s caminhava para o ocaso; com o estatuto em alta, recusou-se a outro dos seus “cheapies” para propor novos horizontes. O resultado foi uma cuidadosa adaptação do conto de Edgar Allan Poe. O filme relacionava a construção visual a um princípio contido no original – a associação entre degradação moral e ruína física. Para contar esta história sem vilões mascarados (“a casa é o monstro”, dizia a Corman para convencer a AIP), reuniu-se o grande naipe de talentos e colaborações que mantiveram-se ao longo dos quatro anos do ciclo que o sucesso do filme originou. Este incluía Haller, Crosby e Matheson – combinados com a música particularmente eficaz de Les Baxter e o uso de quadros impressionistas para reforçar nos retratos a perfídias dos ancestrais de Roderick Usher – uma das melhores composições de Vincent Price.

 

 

1 THE MASQUE OF THE RED DEATH (1964)

 

Da feliz união mercadológica da AIP com a Amalgamated, uma das melhores produtoras de terror britânicas (“The Horrors of Black Museum”, “Peeping Tom”) saiu o maior orçamento de Corman. Melhor uso impossível – nesta obra magistral. Em tempos de Peste (a Morte Vermelha do título), o castelo é o refúgio dos aristocratas pouco recomendáveis, liderados para um incrivelmente pérfido Prospero (Price) em busca de um voluptuoso festim satânico. Mas a “Morte não tem mestre”, diz a própria ao incauto príncipe. Cenários, cores, personagens, história (escrito principalmente por Beaumont, que adoeceu antes de terminar), câmara/luzes (a cargo do genial Nicolas Roeg) – tudo funciona neste pesadelo barroco, amargamente existencial e repleto de poesia.

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por Roni Nunes às 23:38

Motelx 2017: "Boys in the Trees"

por Roni Nunes, Terça-feira, 26.09.17

Artigo originalmente postado em C7nema (http://www.c7nema.net/festival/item/47070-seis-noites-de-terror-docura-ou-travessura-na-terra-do-nunca.html)

 

Seis Noites de Terror: doçura ou travessura na terra-do-nunca

  • Publicado por  Roni Nunes

 

O homem das fabulosas imagens de “Santa Sangre” (exibido sábado) e “El Topo” (domingo), Alejandro Jodorowsky, estará no São Jorge para uma conversa – mediada pelo historiador, crítico e escritor Kim Newman.

Nem só de sessões de filmes vive o Motelx: outros brilhantes aventureiros dos anos 70 (Walerian Borowczyk e Jean Rollin) são temas de conversas com os autores de uma biografia do primeiro (Daniel Bird) e de um conjunto de ensaios sobre o segundo (Kier-La Janisse). Ambos conversam com o público.

Voltando às imagens em movimento, a noite de Halloween vira um rito de passagem para jovens de uma pequena cidade australiana em “Boys in the Trees”.

BOYS IN THE TREES

Richard Linklater encontra o Capucinho Vermelho; não é o último dia de aula (“Dazed and Confused”), mas é Halloween. Numa cidade pachorrenta do sul da Austrália adolescentes fazem diabruras; muitos lutam para não crescer, outros o fazem contra a vontade. Existem aqueles para os quais os caminhos poderão estar fechados; um homem de branco espera na entrada para o portal.

Repleto de anos 90, um coming-of-age devidamente nostálgico, onde as florestas coloridas, as ruas iluminadas e o argumento aproveitam todas as imagens do Halloween para um jornada pelo fantástico. Neste dia a infância acaba; um miúdo (Gully McGrath) que sofre de bullying conta histórias onde mistura fantasia com a realidade; outro (Tobi Wallace) ouve: não é completamente adulto, mas já não é criança. Para ambos a fantasia é a suprema forma de lidar com o inconfessável.

Longa-metragem de estreia do realizador Nicholas Verso. Deu trabalho juntar a ostensiva banda sonora: toda a ação fica mais fácil ao sabor de “Beautiful People” (Marylin Manson) ou “Engel” (Rammstein); no caso de Yoko Ono e Manson os pedidos foram feitos pessoalmente; a conterrânea de Verso, a cantora Wendy Rule, por seu lado, protagoniza aqueles momentos destinados a ficar na memória – o momento fúnebre surrealista onde canta com um gótico figurino a rigor.

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por Roni Nunes às 23:27

Motelx 2017: "Train to Busan", "Berlin Syndrome", "A Dark Song"

por Roni Nunes, Terça-feira, 26.09.17

Artigo originalmente postado em C7nema (http://www.c7nema.net/festival/item/47063-seis-noites-de-terror-comboio-para-a-diversao.html)

 

Seis Noites de Terror: Comboio para a diversão

  • Publicado por  Roni Nunes

 

O yin e o yang no quarto dia do Motelx. Em “Berlin Syndrome” a protagonista fascina-se com tapetes na janela, em “A Dark Song” o contato com o “lado de lá” não inclui telecinese histérica; no extremo oposto não há tempo para olhar pela janela em “Train to Busan”: um suspiro em falso significa uma dentada fatal.



TRAIN TO BUSAN

Clichés de filme-catástrofe, dramas sentimentais colados com cuspo. Críticos americanos referiram o “conteúdo social” do filme; estão habituados à anemia dos seus blockbusters. O que existe aqui é uma “réstia” de ideia, que pode ser resumida assim: os culpados dos males são os especuladores da Bolsa de Valores. Over. Mas nada disto importa. Em “Train to Busan” só os zombies interessam. E a ação – para uma diversão que sabe menos a plástico que “World War Z”.

A Coreia do Sul é um país com uma área pouco maior que a de Portugal com 50 milhões de habitantes: quando uma praga de origem não identificada (o artifício lançado por Romero continua a valer) se abate, até há mortos-vivos a caírem do céu e a infestarem todos os espaços passíveis de serem preenchidos; ultraviolentos, andar requebrado, velocíssimos, mais loucos e ferozes do que nunca.

Fora dos ecrãs mais de dez milhões sul-coreanos saíram de casa para embarcar na viagem: foi o único filme a conseguir a façanha por lá. O responsável já andou pelo Motelx com algo mais sombrio em 2013: Yeon sang-ho fez “King of Pigs”. Também foi sucesso em França e a Gaumont quer fazer um remake. A única coisa a lamentar é que este filme, ideal para uma experiência coletiva de sustos e gargalhadas (dependendo do sentido de humor), não tenha aberto o Motelx 2017.

 



BERLIN SYNDROME

No extremo oposto Cate Shortland propõe uma história de sequestro com a beleza sutil da arthouse: delicados movimentos de câmara, pormenores nas passagens, nuanças nos personagens. Todas as possibilidades a Teresa Palmer mostrar o que vale. Ela é uma turista australiana que anda a fotografar detalhes de uma Berlim desconhecida. Viagem, descoberta, risco, romance. Não será bem assim, mas é o que ela pensa – especialmente conhece um nativo (Max Riemelt), o bom liberal alemão de dia, um fetichista sem humanidade à noite.

Shortland gosta de pôr as suas protagonistas em processos forçados de autodescoberta; mas enquanto em “Lore” Saskia Rosenthal vagueava pela terra arrasada com a ressaca do sonho nazi-nacionalista como pano de fundo, aqui o único movimento é para dentro. Sem hipóteses de saída: ao contrário das aparências, não existem as soluções de thriller (confrontos físicos apenas esporádicos, nenhuma autoridade policial, sem salvadores de para-quedas). O tempo flui à frente das janelas que Palmer olha como uma condenação irremediável. Mas muita coisa está a acontecer.

 



A DARK SONG

Em “A Dark Song” o cenário também único e a quantidade de protagonistas também se resume a uma dupla, mas a jornada de descoberta é bastante menos inocente. Uma mulher (Catherine Walker) aluga uma casa na zona rural de Gales para ter sossego. Alia-se a um rude praticante das artes da cabala (Steve Oran) para adentrar pelo além; quer encontrar seu anjo da guarda (e outras coisinhas mais).

Comparado à vasta tradição de casas a lidar com fenómenos paranormais, “A Dark Song” parece uma meditação. Em termos de cinema não há objetos a voar nem um desespero histérico em provocar sustos (filmes como “Annabelle 2”); “A Dark Song” é contruído num cuidadoso limbo entre a farsa, a crença e o real, onde Gavin conecta-se cinematograficamente com os terrores invisíveis de velhos mestres como Jacques Tourneur.

A Irlanda, país do estreante Liam Gavin, em outros tempos foi terra de mosteiros e sacrifícios ascéticos, das guerras de religião e de um catolicismo arraigado. Talvez isso explique que uma aventura pelas artes mágicas se revele misturada com a mitologia cristã e os seus fundamentos morais, como o perdão – com uma representação visual surpreendente. Conclusão: deste filme anti-sustos não se espera cinismo: na mente do argumentista/realizador o bom e o mau existem e duelam algures no intangível.

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por Roni Nunes às 23:08

Motelx 2017: "The Masque of the Red Death", "The Bad Batch", "The Hounds of Love"

por Roni Nunes, Terça-feira, 26.09.17

Artigo originalmente postado em C7nema (http://www.c7nema.net/festival/item/47058-seis-noites-de-terror-pausa-para-falar-com-a-morte.html)

 

Seis Noites de Terror: pausa para falar com a Morte

  • Publicado por  Roni Nunes

 

No terceiro dia do Motelx: a magia de “The Masque of the Red Death”, o delírio distópico “The Bad Batch” (estreia comercialmente em Portugal com o título “Terra sem Lei”) e a violência sexual de “The Hounds of Love”.

 

THE MASQUE OF THE RED DEATH

 

O príncipe Próspero é o mais perfeito vilão de Vincent Price ao lado do caçador de bruxas de “Witchfinder General”; quando não está a extorquir campónios e a condenar inocentes à morte, salva da peste (a Morte Vermelha) uma turba de aristocratas escroques. Praticante de todas as vilanias possíveis, apenas aguarda o momento do grande festim em honra de Satanás.

 

 

Muita acima do poder dos homens e dos deuses, no entanto, está a Morte; a exibir um variado número de faces e um colorido figurino, ”Ela” explica a Próspero que “não tem chefe”. Na parábola de Corman o bom e o mau surgem sob uma interpretação quase herética: satã não reina, mas o deus cristão (os “bons” do filme parecem saídos de um filme bíblico) também não.

 

Mais não vale dizer: a poesia que emana do filme é para degustação in loco. Há um sumptuoso banquete oferecido pela qualidade habitual de Daniel Haller (diretor de arte), aqui apoiado por ninguém menos que um Nicolas Roeg (fotografia) em início de carreira (havia sido assistente em “Lawrence da Arábia”) e maiores ofertas de capitais provenientes pela associação da AIP com uma das mais interessantes produtoras dos anos 60, a britânica Anglo-Amalgamated. A mudança faz-se notar: a companhia do produtor Nat Cohen vinha desde o final dos anos 50 a oferecer alternativas marcadas de sadismo às convenções sobrenaturais da Hammer – produzindo filmes brutais como “Horror of Black Museum” (1958) e “Peeping tom” (1960).

 

 

O filme é o ponto alto de um ciclo. Aquilo que começou para ser um projeto único baseado em Edgar Allan Poe (“House of Usher”, de 1960) passou a seguir a lógica do que deu lucro: “The Pit and the Pendulum” (1961) foi uma réplica, “The Premature Burial” (1962) um claro sinal de desgaste. Se Corman tivesse um lema havia de ser “quem fica parado é poste”: assim “Tales of Terror” (1962) trazia uma narrativa em episódios e, com o sucesso dos momentos de humor, veio uma comédia explícita – “The Raven” (1963). “The Haunted Palace” (1963) mudou de fonte e foi para H.P. Lovecraft, mas foi vendido como vindo de Poe por razões de marketing. A estas alturas, no entanto, não se imaginava o passo de gigante do penúltimo filme da série – completada com “Tomb of Ligeia” (1964) – obra novamente com belos ambientes, mas que acabou por se ressentir do argumento confuso de, quem diria, Robert Towne, Óscar na categoria em 1975 com “Chinatown”.

 

 

THE BAD BATCH

 

Sob a sombra do serrote de “Mad Max” há uma nova distopia a céu aberto; o título refere-se aos excluídos por decreto (óbvia referência aos refugiados) e tem a fórmula infalível para agradar: canibalismo, amputações, assassinatos gratuitos e “trips” no deserto (a sequência da pastilha é sensacional e a viagem é a borla). Já quem reconhecer Jim Carrey ganha uma entrada para Comfort (onde vivem os privilegiados) e Keanu Reeves está um verdadeiro filósofo enquanto narcotraficante e líder da comunidade.

 

 

Enquanto no interior a bizarrice estilizada corre solta e a luta pela sobrevivência termina frequentemente em churrasco, do lado de fora outras batalhas decorreram. “The Bad Batch” ganhou o prémio do júri no Festival de Veneza do ano passado; mas muitos críticos não gostaram da ementa. A acusação mais justa dos detratores será a de pastiche; certamente muita coisa parece ter saído de algum lugar. No mais pode-se acrescentar que atriz principal (Suki Waterhouse) é ruim e o argumento (da própria realizadora) se perde no deserto a partir de certo ponto.

 

Os filmes de Ana Lily Amirpour, independente dos méritos ou deméritos, inspiram descrições inventivas. Quando deu nas vistas em Sundance em 2014 com “A Girl Walks Home Alone at Night”, foi a própria a inaugurar a série: “o primeiro filme iraniano que mistura vampiros com western spaghetti”. A sensação foi muita e o resultado foi a esta sua estreia em língua inglesa.

 

 

THE HOUNDS OF LOVE

 

Dos espaços abertos para a clausura: no terceiro filme australiano com mulheres amarradas do Motelx (“Killing Ground”, “Berlin Syndrome”) um casal de psicopatas, sequestra, tortura, viola e mata adolescentes e continua a sua vida como se nada fosse. Até que a nova vítima afeta o “equilíbrio” da relação. Livremente inspirado num caso real.

 

Vendido como thriller, mas sem polícias (retratados de forma patética) e com a maior parte da violência fora de campo; a ênfase é no drama. Se Stephen Curry (o sequestrador) é um monstro tranquilo e à vítima (Ashleig Cummings) resta chorar e esperar (ganhou um prémio em Veneza, onde o filme estreou em 2016), cabe a Emma Booth (vítima, sádica, frágil, implacável) assegurar as contradições e o desenlace.

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por Roni Nunes às 22:55

Motelx 2017: "El Bar", "Killing Ground", "Kuso", "X-The Man with the X-Ray Eyes"

por Roni Nunes, Terça-feira, 26.09.17

Artigo originalmente postado em C7nema (http://www.c7nema.net/festival/item/47050-seis-noites-de-terror-quantas-piadas-apocaliticas-cabem-num-bar.html)

 

Seis Noites de Terror: quantas piadas apocalíticas cabem num bar

  • Publicado por  Roni Nunes

 

O segundo dia do Motelx (06/09) traz Álex de la Iglesia e a sua montagem epilética a confabular sobre medos reais e imaginários (“El Bar”), uma história de “salve-se quem puder” florestal (“Killing Ground”) e o campeão da nojeira – o americano “Kuso”. Já Roger Corman tem sessão de autógrafos prevista; posteriormente passa o seu filme mais estranho – “X: The Man with the X-Ray Eyes”.

 

EL BAR

O cinema de terror será dos mais prolíficos a contar histórias em espaços fechados. Coube a um outro espanhol o recorde da aventura: Rodrigo Cortéz construiu um enredo inteiro dentro de um caixão (“Buried”).

Álex de la Iglesia, por seu lado, descobriu que ligar a montagem à corrente produz faísca (“Las Brujas de Zugarramurdi”) e a intensidade do acontecimento ficará completa com piadas em catapulta, beldades banhadas em azeite e um ácido comentário social que trai a aparente brincadeira.

Em causa está o medo – e uma sociedade dominada por ele; a grande ameaça é o Outro – que pode ser um terrorista, um sem-abrigo, ou uma simples “barbie” que não parece ter nada na cabeça. E mais: o pavor facilmente baralha o real com o imaginário.

 

El Bar

 

Segundo o filme, na luta mais terra-a-terra pela sobrevivência o vizinho do lado torna-se rapidamente um alvo a abater; a televisão conspira sempre (tema de “La Chispa de la Vida”) contra todos e os poderosos vão-se ocultar através das suas fogueiras e falsas imagens; só um louco apocalíptico poderá chegar perto da verdade e apenas a descoberta do amor romântico trará alguma redenção no labiríntico esgoto por onde escoa a fealdade humana.

 

Mais prosaicamente, de la Iglesia quis criar personagens a partir de frequentadores de um café próximo à sua casa. É fácil de imaginar que, a partir daí, a ideia tenha evoluído para o seguinte: sob o medo e o horror, as máscaras sociais caem e o ser humano revela-se em toda a pureza do seu objetivo primordial – que consiste essencialmente em tentar não morrer. Tema certamente já explorado – mas o que importa é a forma.

 

KILLING GROUND

O mesmo princípio vale para o australiano “Killing Ground”: aqui a auto preservação põe em causa as juras de amor eterno. Há pinceladas de realismo na ação dos protagonistas face a situações de perigo: assim, eles se contrapõe duramente a jornada do grande super-herói hollywoodiano.

 



Killing Ground

 

De resto, basta um casal apaixonado, uma família com um bebé e dois delinquentes tarados para meter fogo na floresta. O argumentista/realizador australiano Damien Power decidiu, no entanto, evitar a qualquer custo levar o passageiro pela trilha do óbvio. Duas narrativas paralelas servem para deixar o espetador perdido – até porque só mesmo com uma história não-linear para percorrer este caminho gasto.

 

Em algum lugar dos anos 70 jazem atrocidades semelhantes cometidas no bosque (“I Spit on your Grave”), numa vizinhança perto de si (“The Last House on the Left”) ou no matadouro de nenhures (“The Texas Chainsaw Massacre”) – e que levaram os vilões humanos a horizontes além da imaginação. “Killing Ground” é uma proposta eficiente de méritos não aparatosos.

 

KUSO

Quanto ao americano “Kuso”, é preciso dar algum crédito a um filme que chega com o selo Variety de “filme mais nojento já exibido em Sundance” (pôs gente a fugir da sessão). Pode não ser relevante: espíritos sensíveis em festivais de arte andaram a desmaiar no muito mais palatável “Grave” (Raw). Mas “Kuso” é, efetivamente, repelente – embora esse venha a ser o menor problema dos aventureiros da sessão da meia-noite no cinema São Jorge: uma colagem surrealista de momentos grotescos que podem lembrar uma bizarra alegoria distópica – ou, na pior das hipóteses, não remeter a coisa alguma. Um rapper/DJ/produtor musical, Flying Lotus, está por trás da doença.

 

Kuso

 

E por que o nome do filme significa m* em japonês? E por que todos os personagens têm feridas asquerosas (algumas até falam)? A razão mais simples é que Lotus queria homenagear o grande Takashi Miike. “Eu gostaria de fazer um filme que o fizesse sorrir”, disse ao britânico Independent. Mas houve outros objetivos: para Lotus (o nome dele é Steve Ellison) o que é entendido como “cinema negro” é muito pouco visceral. “Eu quis trazer novos elementos para a discussão, fazer um verdadeiro filme de terror”.

A proposta não deixa de ser curiosa para alguém que escondeu-se atrás de um pseudónimo para lançar um álbum de rap. Aconteceu em 2012 e codinome era Captain Murphy. ”Eu sou tímido e achei que todo mundo ia odiar”, justificou-se. Bom, pelo menos agora corre um sério risco…

 

 



X: THE MAN WITH THE X-RAY EYES

Ray Milland consumiu parte considerável dos magros orçamentos de Roger Corman para dar vida ao cientista que inventa um soro para ver além da superfície. À boa moda dos filmes de monstros que infestaram as três décadas anteriores, ele quer provar algo temerário e que, certamente, vai dar errado. Mas curiosamente os efeitos não são o caos social, mas uma singular jornada para dentro.

Roger Corman andava muito ocupado por esta altura com o seu ciclo baseado em Edgar Allan Poe; mas enquanto estes são belos poemas góticos visualmente rebuscados, “X: the Man with the X-Ray Eyes” leva o espectador à uma viagem por um urbano cinzento e à uma travessia que ruma da ciência para o místico, onde não há lugar para o moralizante deus gótico/vitoriano.

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por Roni Nunes às 22:44

Seis Noites de Terror: excessos barrocos e (muito) sangue nas paredes: "The Limehouse Golem"

por Roni Nunes, Segunda-feira, 04.09.17

por Roni Nunes

Artigo originalmente postado em C7nema (http://www.c7nema.net/festival/item/47042-seis-noites-de-terror-excessos-barrocos-e-muito-sangue-nas-paredes.html)

 

O Motelx abre nesta terça-feira (05/09); entre as produções, o britânico “The Limehouse Golem” (em Portugal estreia quinta-feira com o título de “Os Crimes de Limehouse”) e o canadiano “The Void”. O que ambos partilham em comum são os (eventuais) excessos de ideias e (muito) sangue pelas paredes.

 

A  triste figura feminina no tempo da rainha Vitória

 

A argumentista Jane Goldman (que já coescreveu blockbusters como “X-Men First Class”) há de ter gasto longas horas e farturas de neurónios para equilibrar a multidão de meta-referências e reconstruções históricas de “The Limehouse Golem”.

 

The Limehouse Golem

 

O imaginário vitoriano continua a fascinar mais de cem anos depois; Goldman apoiou-se num livro dos anos 90 (do século XX) para dar uma leitura feminina à época. O tempo lembrado pelo puritanismo na superfície e pela selvageria fora da vista (a era de “Dr. Jekyll” e “Mr. Hyde”) é reconstruído com valores de produção alargados e um ator do primeiro escalão (Bill Nighy).

 

Tem mais: há um Sherlock Holmes mais ambíguo e mais no limite vivido por Nighy – um fleumático inspetor da Scotland Yard suspeito do “crime” de homossexualidade e uma história rocambolesca que envolve serial killers, bibliotecas e o mundo do teatro – palco para as referências metalinguísticas (o gosto do público por sangue, o ritual homicida enquanto espetáculo) e assassinatos violentos e explícitos o suficiente para o tirar da trilha de um whodunit (o que é) de telefilme (o que não é).

 

The Limehouse Golem

 

Nas voltas e reviravoltas, tudo se desenvolve sob o ritmo algo pesado da realização do espanhol Juan Carlos Medina (do paquidérmico “Insensibles”, de 2012), que até deixa  escapar sem a devida leveza a anedota vinda do facto do grande e notório “rato de biblioteca” Karl Marx ser suspeito de crimes em série (!).

 

Prevalece a visão brutal da triste figura da mulher num mundo de abusos, violência e, na melhor das hipóteses, de paternalismo oportunista com vista a favores sexuais.

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por Roni Nunes às 21:50


Comentários recentes

  • Cleber Nunes

    Sem dúvida é um filme que me despertou interesse ...



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