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Entrevista com Fernando Vendrell; amor e morte na Évora dos anos 50

por Roni Nunes, Quinta-feira, 29.03.18

Entrevista originalmente postada no Sapo.

 

“Aparição” estreou nas salas portuguesas na última quinta-feira.

 

A adaptação da obra de Vergílio Ferreira mergulha na vida de Évora dos anos 50, abordando a vida de um jovem professor idealista cujo destino cruza-se com o de três irmãs dentro de um ambiente repressivo e conservador.

 

O SAPO Mag conversou com o realizador, Fernando Vendrell, sobre a sorte de ter Victória Guerra como o vulcão feminino que provoca o descontrole do protagonista (vivido por Jaime Freitas, protagonista de outro trabalho recém-estreado, “Amor Amor”), as muitas questões agradavelmente filosóficas propostas pelo material de origem e até alguns episódios caricatos, como “um obsessivo grafiteiro de Évora” que andou a atrapalhar a produção…

 

 

 

RECUO NO TEMPO E NO ESPAÇO

 

“Este filme representa uma rutura na minha carreira”, diz Vendrell.

 

“As minhas três primeiras longas-metragens ["Fintar o Destino", 1998; "O Gotejar da Luz",  2002; "Pele", 2006] fecham entre si um ciclo africano, que abordava questões de identidade e colonialismo”, recorda.

  

A preocupação de estar a adaptar uma obra que pudesse parecer fora de tempo ao espectador atual esteve presente desde o início.

 

“Nós fizemos um esforço para ser contemporâneo. No início havia essa ideia de estar a adaptar um romance datado, de estar a produzir um filme que as pessoas veriam por obrigação – até por ser muito difícil para os atores falarem da forma como os diálogos estavam no livro”, explica o realizador.

 

Com esse sentimento em mente, o guião inicial, que reproduzia vários diálogos do próprio livro, foi sendo reescrito.

 

“Hoje pode-se perceber no filme que existe um grande diálogo com a contemporaneidade – de uma forma diversa há muitos temas que permanecem. Hoje não há censura, castração, repressão, mas ainda existem sistemas na sociedade que não nos obrigam a pensar, dificultam a afirmação da diferença e não capitalizam da melhor forma as valências e energias próprias da juventude”, observa.

 

 

DO HUMANISMO AO INDIVIDUALISMO

 

Sem atirar-se de uma forma cega no “fait-divers”, “Aparição” não descura os elementos filosóficos. Nos anos 50, o humanismo e a fé no futuro iam cedendo terreno a outros valores e a própria obra de Vergílio Ferreira trata essa transição.

 

Como analisa o cineasta, “essa obra é em si já um momento de mudança na carreira do escritor, que caminha em direção ao neorrealismo, onde havia questões humanísticas de alguma forma ligadas a questões sociais de igualdade, solidárias. E passou para um conteúdo muito mais filosófico, mais ligado ao individualismo, à sua maneira de ser e ao significado da vida”.

 

Assim, “no romance ele auto ironiza-se, pois projeta-se, para além do protagonista, em personagens de pendor neorrealista que acham um absurdo ele estar com essas preocupações idiossincráticas e filosóficas, quando o que é importante é que o homem tenha pão para comer, tenha orgulho próprio”.

 

AMOR E MORTE

 

Há romance e morte.

 

Antes do amor, “Aparição” apresenta uma aguda perceção do protagonista masculino acerca de sua transitoriedade.

 

Explica Vendrell: “Há essa ideia da experimentação da morte, de confrontação, no sentido de descobrir um lado irascível para se sentir vivo. O que ele chama de ‘aparição’ é um ato filosófico, de dissociação entre ele a realidade que o cerca, entre ele e a sua vida”.

 

E então há a paixão, particularmente personificado por Victória Guerra a fazer de Sofia, uma de três irmãs que, de certa forma, vão interferir na vida do professor.

 

“A Sofia é uma força brutal do livro. Ela dá uma mancha muito forte na vida dele através da sua imprevisibilidade, da sua incapacidade de controlo. Ela representa paixão, carnalidade, espírito vivo”, detalha o realizador.

 

Certamente cabe aqui também à atriz, um dos jovens talentos da produção audiovisual portuguesa, dar vida de forma intensa à essa personagem explosiva.

 

“A Victoria Guerra foi uma ‘aparição’”, brinca o realizador. E acrescenta: “Foi uma sorte ter conseguido conciliar a agenda para fazer o filme, pois ela própria tem uma força pessoal enorme que certamente ajudou na caracterização da personagem”.

 

 

O GRAFITEIRO DE ÉVORA

 

Para a escolha de Évora numa fase muito inicial do projeto contou o fascínio da arquitetura local.

 

“Ela tem aquele exotismo, mas não é uma cidade mediterrânica típica, uma vez que apresenta também alguma monumentalidade ligado ao classicismo. Fui escolhendo os 'décors' em função de uma cidade imaginária, como se estivesse perdido num labirinto arquitetónico”, lembra Vendrell.

 

Se a arquitetura já lá estava, utilizá-la não foi assim tão simples, apesar de alguns “golpes de sorte”: o icónico café Arcádia, por exemplo, está muito modificado e a cena onde ele entra foi filmada em Montemor. Há o turismo endémico, automóveis, marcas no chão e… um grafiteiro – compondo um episódio desagradavelmente anedótico da produção.

 

“Tivemos apoio da Câmara para limpar as paredes, mas quando chegávamos para filmar no dia seguinte as superfícies estavam pintadas outra vez! Havia um grafiteiro obsessivo em Évora!” [risos], conclui.

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por Roni Nunes às 20:37

«7 Days in Entebbe» (Operação Entebbe), por Roni Nunes

por Roni Nunes, Quinta-feira, 29.03.18

Crítica originalmente postada em C7nema.

 

 

José Padilha consagrou-se com Tropa de Elite, um registo em modo "ação" balizado por inúmeras considerações morais e imbróglios temáticos. No universo exclusivamente do cinema, a sua estreia com capitais internacionais, Robocop, não pode ser considerado um verdadeiro projeto autoral – no sentido que exigências comerciais e de produção condicionaram o que ele eventualmente poderia ter acrescentado à uma releitura do clássico de Paul Verhoeven.

 

Operação Entebbe mete-se por terrenos (muito) pantanosos. Reconstrói um episódio real, o sequestro de um avião da Air France, em 1976, por dois ativistas alemães, ligados à organização Baader-Meinhof (interpretados pelas estrelas do elenco – Rosamund Pike e Daniel Brühl) e um grupo de palestinianos. Com uma decisão algo insólita, eles usam como base para as suas negociações um aeroporto de Uganda, país então dominado pelo muito louco e imprevisível Idi Amin (Nonso Anozie). O governo de Israel desenvolve então a Operação Thunderbolt, uma das mais notórias da sua história.

 

A ênfase é menor na ação do que na tentativa de criar personagens envoltos em dilemas difíceis. Em termos morais, o argumento tenta o equilíbrio quase impossível em conciliar o discurso revolucionário e a suas ações, e as decisões de homens de Estado presos entre a política e o fator humano – todos embrulhados em escolhas de grandes consequências.

 

No mundo dos "terroristas", Padilha faz um esforço q.b., ainda que titubeante, para entender e aceitar a lógica revolucionária dos anos 70. No século XXI, ironicamente um tempo desesperadamente órfão de crenças universalistas coletivas (só a extrema-direita ainda parece tê-las), é necessário um esforço para não ridicularizar a fé ingénua de um pequeno editor alemão (Brühl) no sequestro de um avião em nome da justiça da causa palestiniana.

 

 

A terrorista de Pike é mais ambígua, mas mal construída, resultando ineficaz o drama da personagem vivida por uma atriz deliberadamente desornamentada de sua fulgurante presença física (de Gone Girl, por exemplo). Já o drama do soldado israelita (Ben Schnetzer) e sua namorada dançarina (Zina Zinchenko) retomam os tormentos do capitão Nascimento ("polícia tem família"), mas terminam por não passar de um cliché pouco relevante.

 

De qualquer forma, o facto de ser uma coprodução europeia (envolve a Working Title e o StudioCanal) torna viável que Padilha e companhia elevem o tema do terrorismo a um patamar mais sério do que às fábulas de propaganda de Hollywood – onde o mundo se divide entre bons e maus, estes últimos facilmente catalogáveis em rótulos de marketing estilo "eixo do mal".

 

O espinhoso conflito israelo-palestiniano é enfocado através de dois homens de Estado. De um lado está o belicoso Shimon Peres (futuro moderado na vida real) em modo simpatético (vivido por Eddie Marsan) e de outro Isaac Rabin (interpretado por Lior Ashkenazi) que assume o tom conciliador que seria intolerável no mundo cá fora (fora do âmbito cronológico do filme, viria a ser assassinado por radicais israelitas). Uma nota ainda para Benjamin Netanyahu nos créditos finais, embora aí seja necessário ressaltar a falta de coragem à produção, dentro da sua própria lógica, para referir-se àquilo que foi a sua política de atrocidades.

 

A dança, coreografia de Ohad Naharin e representação da Batsheva Dance Companhy, confere uma graça especial ao filme – unindo sua força simbólica (os dançarinos que se despem de trajes ortodoxos) com as suas possibilidades cinemáticas (as trajetórias paralelas entre o espetáculo artístico e o militar).

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por Roni Nunes às 19:56


Comentários recentes

  • Cleber Nunes

    Sem dúvida é um filme que me despertou interesse ...



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