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IndieLisboa 2018: La Niña Santa

por Roni Nunes, Segunda-feira, 30.04.18

Artigo originalmente postado no Sapo.

por Roni Nunes

 

 

Lucrecia Martel é uma realizadora de sugestões, de insinuações, de estados mentais e instituições de relações aparentemente fechadas, como a família ou a religião. "La Niña Santa - A Rapariga Santa" é dos seus filmes mais ardilosos, um verdadeira labirinto de ambiguidades.

 

É o segundo filme da realizadora e desloca-se dos cenários rurais de "O Pântano" e do extrato social da aristocracia rural para os interiores de um hotel num congresso de médicos. Pelo meio há adolescentes em chamas numa fase pouco propícia à santidade, adultos no limite da carência desesperada e uma mar de atitudes pouco recomendáveis.

 

O filme começa com uma evangelizadora emocionada a cantar música sacra para um grupo de raparigas, entre elas as duas protagonistas, Amália (María Alché) e Josefina (Julieta Zylberberg). Elas não estão assim tão embevecidas e todas as possiblidades de elevação religiosas serão soterradas ao longo do filme mediante enxurradas de descrições sexuais muito pouco subtis. Ainda assim, a primeira embarca numa “missão” quando fica inebriada pelo assédio mais ultrajante de um médico do congresso, o dr. Jano (Carlos Belloso). Este, por seu lado, é o objeto de interesse da sua mãe, Helena (Mercedes Morán), uma mulher divorciada e sensual.

 

Não há nudez, mas há sexo um pouco por todo o lado, na medida que os elementos habituais da iconografia de Martel vão sugerindo diferentes significados (água, piscina, cabelos) e insinuando-se por mais uma história íntima: cenários fechados, poucos exteriores, muitos "closes" e fora de campo. Com um subenredo explosivo, Martel ainda se delicia a deixar um final potencial e novelescamente dramático para… a imaginação do espectador!

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por Roni Nunes às 20:53

IndieLisboa 2018: As Boas Maneiras

por Roni Nunes, Segunda-feira, 30.04.18

Artigo originalmente postado no Sapo.

Por Roni Nunes

 

Diário do IndieLisboa: o engenho da subtileza
 

Filmes como "As Boas Maneiras" demonstram que as possibilidades das fantasias góticas são intermináveis. Marco Dutra e Juliana Rojas já andam há alguns anos a espalhar pelos grandes festivais de cinema mundial as suas histórias. Um deles, "Trabalhar Cansa", já andou por Cannes.

 

Dividido em duas partes, o seu mais recente trabalho narra a história de duas mulheres solitárias: uma rica (Marjorie Estiano), ainda que em situação financeiramente duvidosa, contrata outra (interpretada pela portuguesa Isabél Zuaa) para ajudá-la a tomar conta do luxuoso apartamento onde vive e, principalmente, do seu filho que está para nascer. No entanto, a sina da “baby sitter” será testemunhar estranhíssimos acontecimentos que vão condicionar a sua vida para sempre – tal como narra a segunda parte do enredo e sobre a qual nada se deve revelar! Aliás, como um filme que vai se descortinando aos poucos, quanto menos se souber, maiores as “alegrias”.

 

O visual é cortesia do português Rui Poças, também presente no IndieLisboa no ensolarado "Zama", de Lucrecia Martel. A ideia, bem-sucedida, foi recriar uma São Paulo em tons de fábula, onde os arranha-céus e as pequenas vivendas da periferia servem para satisfazer o desejo elementar de toda a história "gótica", entendida aqui no mais vasto significado de uma palavra imprecisa: retirar os personagens da banalidade quotidiana e levar com elas o espectador ao mundo da fantasia.

 

"As Boas Maneiras" é um filme vigorosamente destemido. Primeiro na questão dos géneros: essencialmente um drama com toques de horror (ou seria o contrário?), tem suspense, humor, animação e, o cúmulo, música. Sobrenatural aqui é como tamanho amontoado de ingredientes não cai no ridículo e, aliás, nem sequer na paródia: leva-se "As Boas Maneiras" a sério até o fim.

 

Há "gore" em doses suculentas e um monstro. Este último é um capítulo à parte, possibilitado pelo tecnologia mais barata e pelo sentido de credibilidade que os realizadores conseguiram imprimir a todo o filme. De resto, Rojas e Dutra entram imperiais no mundo do abjeto: chocar é bom e faz crescer. Não é para muitos, mas é impressionante.

 

E há as entrelinhas: "As Boas Maneiras" é um filme sobre dicotomias de um Brasil tão compreensível quanto contraditório. Sob o pano de fundo das questões femininas, são do mesmo sexo (homossexualismo), de diferentes extratos sociais (abuso de uma sobre a outra) e uma ser branca e a outra negra (racismo).

 

Dutra e Rojas sugerem uma diferença crucial em termos de fantasias góticas. A alteridade não é o Outro, o Estrangeiro: o mal vem de dentro, é uma criatura engendrada no seio da sociedade e, em última análise, no interior de cada um. E para aplacar essa fúria primitiva não há tais remédios como a etiqueta – não há nenhum compêndio de boas maneiras que possa lidar como insublimável.

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por Roni Nunes às 20:47

IndieLisboa 2018: Desolation Center

por Roni Nunes, Segunda-feira, 30.04.18

Artigo originalmente postado no Sapo.

Por Roni Nunes

 

 

Um momento histórico que não desperta boas memórias, marcado por conservadorismo e repressões violentas, foi a era-Reagan – espelho do que acontecia um pouco por todo o lado no início dos anos 80. De uma necessidade de ação libertária e utópica nasceu o "Desolation Center" – mais que um evento, ou melhor, vários deles, um “conceito”. Basicamente, Stuart Swezey, o idealizador, convenceu algumas bandas e alguns muito bem dispostos fãs a embarcar em autocarros para o deserto e tocar. São “festivais” hoje considerados como embriões de mega-eventos posteriores, como Lollapalooza e Coachella.

 

O "punk", como evidente em várias propostas do IndieMusic desta edição, segue incontornável como pontapé para as mais diversas liberdades e tomadas de posição. Também aqui tudo começa com eles e uma necessidade desesperada em fugir a uma polícia, que a estas alturas ataca com o pelotão de choque todos os concertos de punk rock. Um músico dos icónicos Black Flag, a dada momento, assegura a uma apresentadora de televisão, ignorante e sensacionalista como é habitual, que "a polícia representa a nova força neonazi".

 

Há momentos muitos especiais: Mark Pauline, um verdadeiro artista da era industrial (e bélica), responsável por brincadeiras muito perigosas, é um convidado de um dos concertos no deserto. Ele termina por criar um belo simulacro de fim do mundo, perfeitamente completado pelos Einstürzende Neubaten no alinhamento – isso em 1984, quando andavam no auge das suas próprias experimentações com percussões do mundo “real”. Assim, "noise" e explosões conjugam-se na distância do deserto para alguém resumir o espírito de felicidade experimentado pelos presentes: “anarquia total!!!” Por outras palavras, o êxtase do caos.

 

Tudo muito espontâneo e, certamente, ilegal. Estes empreendimentos muito particulares, que ainda terão nas suas fileiras nomes como os dos Sonic Youth e entre os entusiasmados espectadores Suzi Gardner (protagonista em outro filme do IndieMusic sobre a sua banda, as míticas L7), até fazem o empreendedor e também realizador do filme, Swezey, comparar-se a Fitzcarraldo, o personagem homónimo do clássico de Werner Herzog que coordenava o transporte de um navio pelo meio da floresta amazónica...

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por Roni Nunes às 20:10

IndieLisboa 2018: La Ciénaga

por Roni Nunes, Segunda-feira, 30.04.18

Artigo originalmente postado no Sapo.

por Roni Nunes

 

Diário do IndieLisboa: a estreia visceral de Lucrecia Martel
 

 

Calor, bêbados e animais mortos juntam-se num simbólico “pântano” na obra de estreia de Lucrecia Martel, "La Ciénaga", que em Portugal se chamou precisamente "O Pântano".

 

Em 2001, esta realizadora de uma longínqua Salta, cidade de 600 mil habitantes no extremo Noroeste argentino, logrou dar uma contribuição decisiva para a implantação do Novo Cinema Argentino no circuito internacional. Na produção, obteve os préstimos de Lita Santic, também responsável pela estreia de Pablo Trapero dois anos antes com “Mundo Grua”.

 

La Ciénaga é uma pequena localidade que efetivamente existe; mas também significa pântano, nome simbólico mais do que apropriado para aquilo que segue. Martel pinta as tonalidades deste retrato de família com uns pouquíssimos planos iniciais: os copos, a floresta, o animal na lama, a piscina suja e, principalmente, um bando de adultos completamente inertes. Quando Mecha (Gabriela Borges) cai, acusando os efeitos do álcool e cortando-se com alguma gravidade, serão as adolescentes que dormitavam dentro da casa a surgirem em seu socorro. Neste ambiente de decadência mórbida, mais ninguém consegue fazê-lo.

 

O filme não tem uma história propriamente dita e vão-se interligando, aparentemente ao “calhas”, acontecimentos fortuitos, uns mais importantes do que outros e o onde é o próprio quotidiano que pode fornecer os maiores perigos. Mecha tem uma prima, Tali (Mercedes Morán), que se inscreve entre as típicas “pessoas comuns” do universo de Martel – uma provinciana de classe média baixa que inveja a prima “rica” e só diz banalidades. Mas também tem outra finalidade: a ideia de família “normal”.

 

Esta, obviamente, é um mito; há adolescentes em plena pulsão sexual (Leonora Balcarce), pela carência e o desejo homossexual (Sofio Bortolotto), há o seu irmão mais velho (Juan Cruz Bordeu) um “engatatão” que vive com a ex-amante do pai, há Isabel (Andrea López), uma criada tratada como tal (“índia carnavaleira”, acusam), num papel crucial. E, sempre, muitas e ruidosas crianças.

 

Outro dos seus temas é a religiosidade – não a “espiritual”, mas como representação das demandas supersticiosas da população. Mais do que crenças em santas padroeiras, “virgens” e aparições, estas chegam a todos via televisão, esta revelando-se um meio tão importante para difusão da alienação quanto o seu conteúdo. Será um tema mais explorado no filme a seguir, "La Niña Santa" ["A Rapariga Santa", 2004] – embora já se anuncie aqui o seu desencanto laico como a última fala da personagem de Moni.

 

"O Pântano" é a porta de entrada para os perigos do quotidiano e os retratos da "gente comum" de Martel – onde pela última vez (considerando os seus três primeiros filmes) os exteriores serão relevantes – ressaltando, no entanto, que servem para reforçar a clausura do indivíduo, um dos temas dos seus dois filmes seguintes.

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por Roni Nunes às 19:46

Conhecendo o IndieLisboa

por Roni Nunes, Domingo, 29.04.18

Artigo originalmente postado em Cinema em Cena

 

 

Por Roni Nunes, em Lisboa

 

Todos os anos, em torno de 30 mil pessoas passam pelos diversos espaços onde acontece o IndieLisboa, o maior evento de cinema alternativo da capital portuguesa. A edição de 2018 ocorre entre 26 de abril e 6 de maio e, de acordo com a organização, foram selecionados 82 longas e 164 curtas-metragens de um total de 4.500 filmes recebidos. O Brasil estará presente com quatro projetos.

 

O Cinema em Cena conversou com uma das programadoras, Mafalda Melo (entrevista completa abaixo), sobre a participação brasileira no festival, os destaques para os pouco conhecedores de cinema português e as novidades em geral para a 15ª edição.

 

O festival exibe três seções competitivas: para além de uma dedicada à produção internacional e outra à nacional, há prémios distribuídos também na Silvestre, espécie de panorama genérico do cinema independente mundial. É aqui que se inclui “O Processo”, que passa por Lisboa antes de chegar ao Brasil na senda dos aplausos em Berlim e que promete angariar a simpatia (dado o perfil do público) dos espectadores portugueses.

 

Já o retrato da favela no feminino, conforme o olhar de Juliana Antunes em “Baronesa”, e o universo transsexual de Gustavo Vinagre em “Eu Lembro mais dos Corvos”, fazem ambos parte da Competição Internacional. Antunes foi assistente de realização de um dos projetos premiados no ano passado, “Arábia”, de Affonso Uchoa e João Dumans.

 

Por seu lado, a seção Boca do Inferno cumpre uma das tendências dos grandes eventos internacionais dos últimos anos que é a de incluir propostas mais viscerais, frequentemente ligadas ao cinema de terror. É onde está incluído “As Boas Maneiras”, de Marco Dutra e Juliana Rojas, que completam a participação brasileira no festival deste ano.

 

 Cena de "O Processo", de Maria Augusta Ramos

 

Menção ainda para outras três divisões da programação igualmente importantes: Herói Independente, que este ano inclui retrospetivas dedicadas à argentina Lucrecia Martel e ao veterano francês Jacques Rozier e que destacou, há alguns anos, a obra de Júlio Bressane, a sempre apetecível IndieMusic que, como o nome indica, direciona-se a trabalhos relacionados com música, e Director’s Cut, que exibe filmes que refletem sobre outros filmes já existentes.

 

CINEMA EM CENA: O IndieLisboa tem selecionado sempre cinema independente brasileiro, ajudando a que seja menos desconhecido em Portugal. Como tem sido essa relação ao longo dos anos e que pode dizer sobre os projetos selecionados para esta edição?

 

MAFALDA MELO: O cinema brasileiro tem estado em ebulição nos últimos anos, não só politicamente mas como movimento estético. O IndieLisboa tem prestado muita atenção a essa renovação e tem reforçado a sua presença em Portugal com o acompanhamento de cineastas desta nova geração. Aconteceu com Juliana Antunes, Gustavo Vinagre (ambos mostram a sua primeira longa-metragem em competição neste IndieLisboa), Kleber Mendonça Filho, Marco Dutra e Juliana Rojas, Leonardo Mouramateus, Ricardo Alves Jr., Gabriel Mascaro, Caetano Gotardo, entre tantos outros – a lista é infindável. 

 

Há também o cuidado de olhar para o passado do cinema moderno brasileiro, mostrar os seus alicerces: foi o caso de retrospectiva Julio Bressane, por exemplo. Hoje mais ainda, como festival que olha para o contexto em que se produzem os filmes - seja através do apoio à produção portuguesa, seja através de uma selecção que é também a voz de uma actualidade em constante agitação - é importante mostrar que estamos do lado certo. “O Processo”, de Maria Augusta Ramos, está do lado certo. São de referir, ainda, as diversas parcerias que temos com festivais e programadores no Brasil, que nutrimos ao longo destes 15 anos e às quais queremos dar continuidade.

 

 "As Boas Maneiras", de Marco Dutra e Juliana Rojas

 

Um dos filmes exibidos é “O Processo”. Há uma curiosidade enorme em relação a este filme – principalmente pelas questões políticas. A política no Brasil tem sido muito comentada em Portugal. O que pode adiantar sobre o filme em si e que tipo de debate acha que o filme pode proporcionar aqui em Portugal?

 

“O Processo” é um mundo de possibilidades para um festival de cinema que pretende ter uma voz interventiva. A selecção do filme pareceu-nos óbvia no momento em que o vimos, não só pelo seu inestimável valor fílmico, mas também porque em Portugal temos vivido a turbulência política no Brasil de forma muito próxima. A morte de Marielle Franco e de Anderson Pedro Gomes desencadeou vigílias em 6 ou 7 cidades pelo país. Não me recordo de um tipo de mobilização solidária com outro país que tenha sido vivida de forma semelhante nos últimos anos, penso que nem o impacto dos atentados em França, país onde reside a maior comunidade emigrante portuguesa, gerou tamanha solidariedade, revolta, comoção.

 

A exibição de “O Processo” durante o festival ajuda-nos a dar continuidade ao debate e a refletir sobre uma questão essencial: como pode o Brasil regredir até uma nova era de militarização do estado? É urgente parar este processo que escalou gravemente a partir da destituição de Dilma Rousseff, o “golpe”, que Maria Augusta Ramos documenta de forma extraordinária no filme.

 

Na mesma via, o cinema português não é bem conhecido no Brasil. O que pode dizer sobre os projetos selecionados para o IndieLisboa este ano?

 

Penso que o cinema português viaja cada vez mais, também até ao Brasil. As coproduções e colaborações são frequentes (no IndieLisboa 2018 apresentamos uma colaboração, “Russa” de Ricardo Alves Jr. e João Salaviza) e as internacionalizações de filmes portugueses têm crescido enormemente. Mas, para quem não está tão familiarizado com o cinema português diria que a competição nacional e as sessões especiais são um excelente panorama de um excelente ano de cinema português.

 

Iremos mostrar os filmes absolutamente marcantes de André Gil Mata (“A Árvore”) ou Susana Nobre (“Tempo Comum”), proporcionar a descoberta da voz de Paulo Carneiro (“Bostofrio, où le ciel rejoint la terre”) regressar ao fabuloso universo de André Santos e Marco Leão (Self Destructive Boys), Filipe Melo (Sleepwalk), Sérgio Tréfaut (Raiva) ou Edgar Pêra ("O Homem Pikante - Diálogos com (Alberto) Pimenta"), para citar apenas alguns dos 49 filmes portugueses que integram a programação do festival.

 

Por fim, pediria que destacasse algumas das novidades da edição deste ano em termos gerais.

 

O IndieLisboa volta a apontar o foco para nomes consagrados do cinema de autor mundial e a revelar um conjunto alargado de novos e promissores autores. Esta mistura constitui uma das características mais importantes do festival desde a sua origem, tal como a igual importância dada a longas e curtas-metragens e à abolição de quaisquer fronteiras de gênero. No fundo, há uma liberdade intrínseca aos filmes selecionados, que percorre também o gesto de programação e a forma como o festival é pensado. Um festival livre, de cinema livre.

 

Esta edição volta, portanto, a fortalecer as suas já reconhecíveis características: uma seleção desafiante; a (re)descoberta de autores através de retrospetivas essenciais, este ano dedicadas a Jacques Rozier e Lucrecia Martel; uma programação noturna de concertos e festas que estende a experiência em sala e põe os filmes a dialogar com a música, com os artistas, com os convidados e com o público; um conjunto de atividades que complementam os filmes e abrem (mais ainda) espaço para debate; uma programação especialmente dedicada a crianças e jovens. 

 

E uma grande novidade: a criação de um Festival Center, um centro nevrálgico para a indústria onde decorrem as Lisbon Screenings, laboratórios, encontros, “masterclasses” e outros eventos para o público profissional.

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por Roni Nunes às 14:56

IndieLisboa 2018: The Night Eats the World

por Roni Nunes, Sábado, 28.04.18

Artigo originalmente postado no Sapo.

Por Roni Nunes

 

 

O conceito desenvolvido por Richard Matheson em "I Am Legend", nos anos 50, estava destinado à uma vida longínqua. Um homem, que pode ser o último na Terra, um cerco que exige uma organização metódica para sobrevivência, e um exterior infestado de criaturas hostis. George Romero aproveitou a ideia e mudou para sempre a história dos filmes de "zombies" em 1968 com "A Noite dos Mortos-Vivos".

 

Solidão, violência e o fantasma do apocalipse: uma face válida para o glorioso século XXI – que na cinematografia "zombie" arranca a abrir com os mortos-vivos velozes de "28 Dias Depois" e segue alegremente violenta pelos "walking deads" fora.Dominique Rocher ousou inserir mais um na linhagem, "La Nuit a Dévoré le Monde", mostrando que as realizadoras francesas de filmes de terror chegaram para ficar: no passado, a mesma secção do IndieLisboa exibiu a estreia visceral e imaginativa de Julie Ducornau com "Grave".

 

Sam (o norueguês Anders Danielsen Lie, de "Oslo 31 de Agosto") desperta já num cenário propício para um cerco – um apartamento – depois um edifício quase inteiro. A lei da selva segundo Rocher implica, felizmente, bastante sangue nas paredes e cenas de ação bem executadas – como demandam hoje em dia os conhecimentos técnicos tornados cada vez mais elementares e uma tecnologia acessível.

 

Quanto à gestão de tempo, sempre fundamental em histórias minimalistas de sobrevivência, a realizadora percorre esse caminho muitas vezes trilhado com as suas próprias inventices (o toque “Robinson Crusoé” e o sempre imperdível Denis Lavant como o “Wilson” de Sam) e brincadeiras (a piada dos “fãs” a correrem para o concerto do “ídolo”). A despeito do tema, Rocher opta por um cenário ensolarado, onde a música tem um papel importante na sobrevivência mental de Sam – tal como o seu poder de imaginação, responsável por um dos momentos cruciais de revigoração da narrativa perto do fim.

 

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por Roni Nunes às 15:12

IndieLisboa 2018: Adieu Philippine

por Roni Nunes, Sábado, 28.04.18

Artigo originalmente postado no Sapo.

Por Roni Nunes

 

Diário do IndieLisboa: fantasmas de guerras, alegrias juvenis
 

O veterano Jacques Rozier, um dos Heróis Independentes do IndieLisboa 2018, inscreveu o seu nome na fase inicial da "Nouvelle Vague" francesa com apenas um filme. “Adieu Phillipine” traz uma animada Paris sob pano de fundo e acompanha, com uma entusiástica banda sonora, as perambulações de duas jovens (vividas por Stefania Sabatini e Yveline Céry) descontraídas pela cidade. A dado momento, ambas namoriscam com o mesmo rapaz, Michel (Jean-Claude Amini) – um jovem operador de câmara em vésperas de ser enviado para a Guerra da Argélia.

 

Próprio de uma época de ascensão da cultura de juventude, “Adieu Phillipine” traz a leveza do espírito juvenil e do descompromisso – simbolizada principalmente nas jovens que, apesar de um certo recato, infringem alegremente as regras dos “bons costumes”. O título do filme, sem significado literal nenhum, é “encontrado” pelas duas num jogo antes de dormir: aquela que ao acordar dissesse primeiro “adieu Philippine” ficava com o rapaz antes da outra...

 

Sem uma narrativa linear, há histórias sobre carros, bares, festas e muitos piropos (será que hoje em dia se chamaria “assédio”?) – vindos de homens mais velhos ou de rapazes – que se estendem das ruas da metrópole à Córsega, onde Michel decidiu aproveitar os seus últimos dias antes de se juntar ao exército. O tom não é sempre o mesmo: ao de cima também vêm os limites dos relacionamentos “liberais” – tal como a sombra da guerra.

 

O filme de 1962 lega ainda umas curiosas “previsões”, como num jantar onde um familiar de Michel diz que na Guerra Fria “nem Estados Unidos nem União Soviética ‘prestam’ e que ambos têm medo é da China, que será uma grande potência!”.

 

Apesar do filme ter estreado no Festival de Cannes e ser elogiado pelos companheiros da "Nouvelle Vague", “Adieu Philippine” é um exemplar raro de uma carreira cinematográfica errática para Rozier, que só voltaria a lançar outro filme de ficção em 1971.

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por Roni Nunes às 15:07

IndieLisboa: em busca do "ser português" numa aldeia em Trás-os-Montes

por Roni Nunes, Sábado, 28.04.18

Artigo originalmente postado no Sapo.

Por Roni Nunes

 

IndieLisboa: o Portugal antigo sobrevive numa aldeia de Trás-os-Montes
 

"Bostofrio – Où le Ciel Rejoint la Terre", filme de estreia do realizador Paulo Carneiro, tem sessões no IndieLisboa nos dias 28 de abril (Culturgest) e 4 de maio (cinema São Jorge).

 

O “Bostofrio” do título é o nome de uma pequena aldeia entre as montanhas no Nordeste de Portugal. Pertence ao concelho de Boticas e Paulo Carneiro, assistente de realização de dois filmes de João Viana, foi até lá. A ideia era procurar as suas origens paternas – ir ao encontro das memórias de um avô que não conheceu e não perfilhou os filhos. Mais do que isso, no entanto, embrenhou-se por outras ideias: um retrato, ainda que simbólico, das dicotomias do que é “ser português”…

 

Antes disto, no entanto, foi duro o périplo pelos segredos e tabus que ainda cercam o povo local, à partida muito reticente em mexer no passado.

 

“Quero lá saber do teu avô!”, diz a primeira entrevistada, dando ao início do filme uma forma anedótica. O realizador, no entanto, decidiu manter a conversa com a sua pouco interessada interlocutora. "Sim, ela tem essa maneira de falar, mas há um carinho ali, que se pode notar. E claro que ela sabe que está a ser filmada", recordou.

 

Essa introdução dá um retrato das reticências que cineasta terá de vencer para avançar no percurso. É algo que remete às origens: a vida na pequena localidade nunca foi fácil. "Se for preciso são os teus melhores amigos, ficam zangados se não fores à casa deles, se não comeres qualquer coisa lá. Mas há uma forma rude que vem de um ambiente muito hostil. É algo que dá para ver no filme, é uma população isolada, cercada de montanhas. Cerca de 30 pessoas vivem lá", explica.

 

 

Suspense orgânico

 

Pôr as pessoas à vontade era essencial para abordar segredos e tabus do passado. Foi como se conseguiu criar um suspense orgânico na medida em que a organização do material segue a ordem cronológica em cerca de 80%. Munido de mais conhecimentos revelados por um entrevistado, Paulo Carneiro conseguia aumentar o alcance da conversa a seguir. "O caminho para o final é completamente documental", salienta.

 

Muitos planos são fixos e registam de longe as conversas. É uma questão de pragmatismo de produção tanto quanto de desejo estético. "Sabia que não ia ter tempo para preparar as entrevistas", conta o cineasta, que teve um mês para ficar no local depois de ganhar uma Bolsa para Jovens Criadores do Estado. "Assim, aparecer no filme era também uma forma de ir fazendo o registo ao mesmo tempo que os ajudava a esquecer que estavam sendo filmados".

 

Já em termos estéticos, a ideia era "mostrar que, apesar dos planos serem fixos, havia movimento. Há uma tentativa de criar uma ‘mise-en-scène’ onde tem sempre algo em movimento". Os conceitos são da História Oral, tendência historiográfica que privilegia os depoimentos em primeira pessoa.

 

"Acredito piamente numa história para além da escrita e esta é uma ideia que continuará a ser explorada num dos meus próximos projetos. Aqui queria preservar as falas de Trás-os-Montes, que são belíssimas, com as suas expressões típicas, tenho uma relação de afetividade com este vocabulário. Também li muito Miguel Torga, que escreve bastante sobre a região”, recorda.

 

 

Em busca do “ser português”

 

Desde o início a ideia foi homenagear o pai, uma espécie de sobrevivente de uma época dura. Nascido na pequena aldeia, foi declarado como tendo "pai incógnito", criado pela mãe com problemas psíquicos e ajudada por uma tia num altura de miséria e superstição.

 

Com a faceta pessoal do projeto, no entanto, cruza-se um outro conceito – o das dicotomias ligadas à uma ideia de "ser português". A da existência de um Portugal antigo, com os seus tabus sexuais, a miséria económica e onde os problemas mentais eram vistos como uma espécie de "possessão demoníaca".

 

"Certamente há um paralelismo entre o céu e a terra, o místico e o terreno, Deus e o demónio, especialmente quando percebi que as pessoas ligavam o passado da minha avó a algo infernal. Assim, o resultado final deixou de ser apenas uma procura pessoal minha e tornou-se noutra coisa", concluiu.

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por Roni Nunes às 14:57

"Hip to da Hop": Há "Hip hop português a invadir o IndieLisboa

por Roni Nunes, Sábado, 28.04.18

Artigo originalmente postado no Sapo.

Por Roni Nunes

 

 

“Hip to da Hop” propõe um mergulho no mundo da cultura muito urbana do hip hop, estilo musical adaptado em Portugal a partir da sua origem do Bronx, bairro nova-iorquino. Surge acompanhado de outras manifestações culturais: o “rap”, o DJ, o “breakdance”, o “grafitti”.

 

O filme tem sessões no âmbito do IndieLisboa nos dias 28, no cinema São Jorge, e 30, na Culturgest, e os cineastas explicaram ao SAPO Mag o que os entusiasmou registar após uma viagem de Norte a Sul do país…

 

SAPO Mag - O subtítulo do vosso filme, "Viagem a Portugal em 4 Vertentes", pressupõe a ideia de deslocação espacial generalizada no país do universo do hip hop e as suas várias manifestações culturais. É um fenómeno curioso quando conectado com as suas raízes, que eram dos bairros negros de grandes cidades norte-americanas...

 

O subtítulo do “Hip to da Hop” é uma pista acerca do tema do filme, que é de facto uma viagem que ambos também fizemos para poder compreender melhor esta cultura. E a melhor parte dela foi termos sido guiados pelas pessoas que entrevistamos - falávamos com alguém que nos levava a outro artista e que, por sua vez, nos indicava um terceiro. Na construção do argumento quisemos provar uma sensação semelhante à que nós vivenciamos, por isso colocamos apenas a voz de quem participa e as imagens e os sítios onde estivemos. Assim deixamos que um “writer” de Lisboa partilhe a sua visão e nos leve até um “B-boy” do Porto e por aí afora.

 

É de facto interessante perceber como é que uma cultura dos Estados Unidos, que nasceu para travar as lutas entre gangues, é importada para Portugal. Ela chega até nós quase vinte anos depois de ter nascido, já sedimentada e cristalizada através dos “medias” e das cassetes. Houve no início um processo natural de imitação em todas as artes, um processo de aculturação. Quando começámos a fundir a cultura portuguesa com a do hip hop o jogo começou a mudar.

 

De certa forma, sentimos que ainda estamos nesse processo e que somos bastante exigentes connosco nesse sentido, há uma demanda profunda no hip hop naquilo que é único e genuíno, na criação de arte que represente o criador e o local em que vive. Essa apropriação, evolução e as transformações que a tornaram numa parte integrante da cultura portuguesa, foram de facto alguns dos motes do nosso filme.

 

"Hip to da Hop" - Aiam

 

Vocês encaram o universo da música hip hop como enquadrada num quadro artístico mais amplo que envolve o "grafitti", o DJ, o rap e o breakdance. Acham que todos esses fenómenos são indissociáveis?

  

Ao longo dos anos tem havido uma perceção errada do que é a cultura hip hop. Muitos julgam que é apenas música ou uma dança. O que nos parece importante perceber é que não são só os elementos que tornam o hip hop em algo cultural, são também os valores e as regras que fazem parte desta cultura. O ponto de discussão que muitas vezes surge é o afastamento físico dos artistas das várias vertentes. Quando a cultura nasce no Bronx, DJ, “B-boys”, “writers” e “rappers” estavam todos próximos porque era ali o núcleo.

 

Quando surge em Portugal eram poucos e, de uma maneira geral, todos se conheciam. As coisas hoje mudaram: a expansão e as revoluções tecnológicas permitiram uma individualização que ao início não existia. É algo óbvio e talvez uma evolução necessária. O que nos interessou sobretudo compreender foram as consequências que isso trouxe e as opiniões sobre este ponto entre os artistas das diferentes gerações. Para muitos o hip hop não existe porque as pessoas não estão próximas. E, para outros, continuará a existir enquanto respeitarmos as mesmas regras. Quem tem razão? É algo interessante no filme: ver pessoas que pertencem à mesma cultura com uma opinião bastante diferente. Enquanto realizadores sentimos necessidade de abordar esta questão.

 

Há um aspeto muito interessante no filme que é o caráter quase didático, no bom sentido, de alguns depoimentos que recolheram entre os artistas. Eles explicam o seu método de trabalho...

 

O caracter didático é, sem dúvida, um dos pontos-chave do filme, embora seja algo que não tenhamos intencionalmente provocado. Ambos aprendemos imenso durante a viagem e isso foi algo que tentámos transmitir – até porque chegamos a ter entrevistas com quase três horas. Vários temas foram abordados nestas conversas. Ficamos fascinados com os diferentes processos criativos dos artistas. Cada um cria à sua maneira com base na sua personalidade e nas suas rotinas. O método de trabalho varia de pessoa para pessoa, de vertente para vertente, de geração para geração. Colocamos isso no filme porque achamos realmente interessante.

 

E, como consequência, existe um papel didático nisso. O nosso objetivo foi sempre criar uma obra cinematográfica interessante, que fugisse do típico estilo documental televisivo e que se tornasse numa peça digna de ser recordada daqui a uns anos. Compreendemos o papel educacional, antropológico e social que possa eventualmente ter. Mas desde inicio que o nosso principal objetivo foi fazer um bom filme.

 

"Hip to da Hop" - Ace & Mundo

 

Outra questão recorrente do filme é o da evolução do hip hop dentro do país. Neste sentido vocês encontram otimistas, para os quais "tudo é válido", e outros que salientam a perda da profundidade poética, política e formal de muitos "rappers". Como vêem esse fenómeno da massificação de um movimento cultural que teve muitas dificuldades em se afirmar no início?

 

Há uma frase que consideramos importante no filme e que, porventura, descreve um pouco estes últimos anos, ou seja, "tudo foi transformado". O filme mostra essas transformações e as evoluções que as diferentes vertentes foram atravessando. Hoje a cultura hip hop de certo modo popularizou-se e, talvez, aquela vertente que melhor reflete isso é o rap. É o estilo que encabeça os maiores festivais de música e é o mais ouvido no mundo inteiro nos serviços de "streaming".

 

As consequências, positivas e negativas, que isso trouxe são naturalmente imensas. Ao início os artistas não eram reconhecidos, as condições técnicas eram baixas, os salários igualmente baixos ou inexistentes. O facto de todos estes pontos se terem invertido acarretou várias mudanças: de um lado, irá sempre haver quem se aproveite para atingir fins financeiros e desvalorize os valores e as doutrinas que regem a cultura. Por outro, no entanto, trouxe melhores condições a todos aqueles que realmente se importam e se preocupam com estes pilares. A discussão não é nova: se analisarmos a história da cultura já era discutido ao início e certamente continuará a ser durante as próximas décadas.

 

Optaram por não usar apenas música de artistas de hip hop, mas também uma banda sonora mais tradicional, mais atmosférica...

 

A banda sonora tem um papel crucial no filme: ambos somos bastante exigentes e nós queríamos ter a música certa nos momentos adequados. Tivemos a oportunidade de trabalhar com artistas que construíram uma sonoridade sublime para a obra.

 

É o caso do António Lopes Gonçalves, que nos transporta para um Portugal quase imaginário através da sua guitarra; dos SleepinPatterns X Lost Soul, que criaram a textura para a maioria do filme, reforçando as emoções, as palavras e toda a componente imagética existente; e os SillabnJay Fella trouxeram a voz e uma mensagem para uma música que faz uma ligação enorme com o filme e tem várias pistas na letra sobre uma das temáticas do "Hip to da Hop". A textura sonora criada agradou-nos tanto que decidimos lançar um álbum de originais depois da estreia. Ver este filme a dar origem a outros projetos é algo que nos satisfaz bastante e é algo que gostaríamos de continuar a fazer

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por Roni Nunes às 14:51

IndieLisboa 2018: Ryuichi Sakamoto: Coda

por Roni Nunes, Sábado, 28.04.18
Artigo originalmente postado no Sapo.
Por Roni Nunes
Diário do IndieLisboa: os diversos tempos de Ryiuchi Sakamoto
 

Há documentários que conjugam com montagem frenética o objetivo do inventário, outros que optam pela longa duração por dificuldade de selecionar o que manter. O que impressiona em "Ryuichi Sakamoto: Coda" é o facto da gestão de informações ter sido organizada de uma forma que permite a aflorar de uma poesia muito particular enquanto nada praticamente falta de uma carreira de quatro décadas. O filme prolonga-se pelos diversos tempos de vida e obra da música, ator e ativista japonês – interligando de forma qualquer invisível os pedaços que compõe uma visão genérica do artista.

 

O filme começa com Sakamoto e um cadáver – mais precisamente o do piano que encontra nas ruínas do desastre de Fukushima. A tragédia sensibiliza-o: toca o piano, circula pela terra devastada, vai a manifestações. A homenagem às vítimas com um momento musical icónico (a execução de “Forbidden Colours” acompanhado de violina e violoncelo) faz a primeira ponte com o seu passado – neste caso a música para “Feliz Natal, Mr. Lawrence”, clássico de Nagisa Oshima (1983) que possibilitou a oportunidade para um dos seus momentos mais famosos.

 

O passado brilhante é inevitável: pioneiro da música eletrónica e do uso da tecnologia com o Yellow Magic Orchestra ("o que me interessa não é destruir a tecnologia, voltar atrás, mas encontrar as suas falhas e ruídos", dizia na altura), o facto do seu trabalho mais conhecido do grande público (a estupenda banda sonora de "O Último Imperador") sair de processos criativos exaustivos e pedidos repentinos de Jeremy Thomas ou comentários desapiedados de Bernardo Bertolucci, os esforços extremos para contornar os problemas de saúde porque "não podia recusar um pedido de Alejandro Inharritu" (viria a ser a música de "The Revenant") e assim por diante.

 

No presente do filme, Sakamoto está a lutar contra um cancro. Poucas cenas, tudo dito: dificuldade em comer, alimentos "saudáveis" cujo um mero olhar demonstra o quanto eles lhe parecem "saborosos". Quando está melhor, o presente traz-lhe as alegrias do processo criativo: o ballet sem gravidade de "Solaris" (e o seu coral de Bach na banda sonora), o livro de fotografias extraídas dos seus filmes ("Instant Light"), a orquestra de sons da natureza de alguns dos seus filmes: Tarkovsky é agora a sua fonte de ligação com a criação.

 

Entre o passeio no tempo, longínquo, recente e presente, reside a graça de um filme que diz muito sem dizer tudo (até porque o "tudo" não existe) e onde vida e obra fazem uma comunhão solene para significar a fé de um homem na sua arte.

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por Roni Nunes às 14:37


Comentários recentes

  • Cleber Nunes

    Sem dúvida é um filme que me despertou interesse ...



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